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Meaghan Smith

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A cantora Meaghan Smith é considerada uma das grandes revelações da música pop canadense. Membro da Igreja sud, Meaghan compõe músicas em que surgem referências musicais das décadas de 1920 a 1940. “Eu gosto que essa música é limpa”, diz a cantora, expressando uma visão estética influenciada por sua religiosidade, ainda que suas canções não tratem de temas em si religiosos. “Quero escrever músicas que famílias possam curtir juntas”.

Meaghan recebeu no final de março o prêmio Juno de Artista Revelação, a mais importante premiação da música pop do Canadá, equivalente ao Grammy norte-americano. Outros canadenses como Neil Young, Arcade Fire e Justin Bieber também foram premiados na ocasião.

O site oficial da cantora mostra sua autobiografia em forma de animação. No YouTube podem ser conferidos vídeos de suas músicas, como Drifted Apart, A Little Love e o cover para Here Comes Your Man, clássico da banda Pixies.


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Mãe Celestial redescoberta?

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Mãe e criança, pintura de Gustav Klimt (1862-1918)

A existência de uma divindade feminina, esposa de Deus o Pai, é um dos ensinamentos mais distintos do mormonismo. Quase transformado em tabu em décadas recentes, o tema hoje parece receber pouco mais que tímidas alusões no cotidiano da Igreja sud. Sequer a palavra “Mãe” é geralmente mencionada em textos oficiais, mas apenas subentendida nas alusões a “pais celestais”, como no documento A Família: Proclamação ao Mundo e no livro Princípios do Evangelho. O hino Ó Meu Pai, escrito em 1845 por Eliza R. Snow, esposa plural de Joseph Smith,  permanece para a grande maioria dos membros como a afirmação mais acessível de tal doutrina:

Eliza R. Snow (1804-1887)

Pelo espirito Celeste

Chamar-te pai eu aprendi

E a doce luz do evangelho
Deu-me vida, paz em ti.
Há somente um Pai Celeste?

Não, pois temos mãe também
Essa verdade tão sublime
Nós recebemos do além!

A quantidade relativamente grande de referências à Mãe Celestial em discursos e escritos de líderes da Igreja no final do séc. XIX e início do séc. XX contrasta com a percepção contemporânea do tema na Igreja e a posição marginal que ocupa. Em décadas mais recentes, esse ocaso é atribuído por alguns às leituras feministas do tema entre intelectuais mórmons norte-americanos nas décadas de 80 e 90, incluindo alguns dos seis autores excomungados em 1993, como Margareth Toscano.

Gordon B. Hinckley (1910-2008)

Em 1991, o presidente Gordon B. Hinckley, então primeiro conselheiro na Primeira Presidência, havia enfatizado que não era apropriado orar à Mãe Celestial. Naquele contexto incerto e doloroso, é muito provável que as mensagens foram recebidas pelos membros em geral como se significassem que o tema em si – Mãe Celestial – era inadequado ou mesmo um  motivo potencial de excomunhão. Preocupações desse tipo podem ter sido ainda maiores para os membros sud fora dos EUA, ao receberem tais afirmações fora de contexto. Mas essas percepções talvez possam estar mudando.

Na última edição da BYU Studies, periódico oficial da Brigham Young University, mantida pela Igreja sud, David L. Paulsen and Martin Pulido tentam apresentar uma síntese dos ensinamentos de líderes da Igreja sobre a existência e papéis da Mãe Celestial ao longo da história mórmon. Em ‘A Mother There’: a survey of hstorical teachings about Mother in Heaven, os dois autores prestam um grande trabalho à compreensão do tema ao mostrarem para o público sud atual o fato mais óbvio mas não menos crucial: de que não se trata de um tema proibido e o silêncio que prevalece hoje não encontra paralelo na história da Igreja. De acordo com Paulsen, uma das motivações para escrever o artigo foi justamente “minha perplexidade quando recentemente comecei a ouvir com  frequência cada vez maior pessoas falando sobre a necessidade de um ‘silêncio sagrado’ com respeito à Mãe Celestial”.

A pesquisa em si, financiada pela BYU e publicada no seu periódico, revela que há hoje uma abertura no debate doutrinário mórmon para reenfatizar a posição da Mãe Celestial em nossa teologia. Resta saber se o debate iniciado num periódico acadêmico terá reflexos no discurso da Igreja. Além disso, de que forma a doutrina será devidamente “encaixada” no quadro maior. A posição da mulher em relação ao sacerdócio, por exemplo, é um dos assuntos que podem vir à tona, relacionados ao tema da Mãe Celestial, o que aparentemente não desperta as melhores atitudes na maioria dos membros da Igreja sud.

O que você pensa sobre isso?

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Origem e destino da mulher

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A posição da mulher na doutrina mórmon ganhou uma reflexão especial pela pena de John Taylor. Morando em Nova York para editar o jornal The Mormon, na década de 1850, John Taylor conheceu a jovem e bela Margaret Young (sem  parentesco com Brigham), então com vinte anos. Transformando em artigo do seu jornal parte do que havia escrito em cartas de amor a Margaret, Taylor publicou, em 1857, Origem e destino da mulher, traduzido abaixo. Em setembro de 1856, Margaret havia se tornado esposa plural de John Taylor, com quem ainda teria nove filhos.

Que ideias no texto de Taylor a respeito da mulher seriam hoje um ar fresco na teologia sud atual? Que ideias não fazem mais sentido fora do contexto histórico original? Que doutrinas ensina John Taylor que chamam sua atenção, leitor(a)?

Com a palavra, John Taylor.

Origem e destino da mulher

 Os santos dos últimos dias têm sido ridicularizados muitas vezes por sua crença na pré-existência dos espíritos e por casar para o tempo e toda eternidade, sendo ambas doutrinas bíblicas. Somos freqüentemente requisitados a dar nossa visão em relação a estes princípios, mas considerando que as coisas do Reino pertencem aos filhos do Reino, não são, portanto, para dá-las àqueles que não o têm. Mas tendo sido gentilmente requisitado por uma senhora (membro da Igreja), há alguns dias, para responder as seguintes questões, não poderíamos realmente recusar, quais sejam: “De onde vim? O que faço aqui? Aonde vou? E qual meu destino depois de obedecer a verdade e perseverar até o fim?”.

Para seu benefício e de todos os interessados, vamos tentar responder brevemente as perguntas como as entendemos. A razão será evidente para nossa crença na pré-existência dos espíritos e no casamento para o tempo e toda eternidade.

Senhora, de onde vieste? Qual tua origem? O que fazes aqui? Aonde vais e qual teu destino? Diga se tens entendimento. Não sabes que és uma centelha da Deidade, saída de Seu eterno braseiro e trazida em meio do eterno fulgor?

Não sabes que nas eternidades passadas, teu espírito, puro e santo, habitava no seio do teu Pai Celestial, e em sua presença, e com tua Mãe, uma das rainhas do céu, cercada por teus espíritos irmãos e irmãs, no mundo espiritual entre os Deuses? Que à medida que teu espírito contemplava as cenas que lá transpiravam e tu crescias em inteligência, viste mundos após mundos serem organizados e povoados com teus espíritos semelhantes que tomaram sobre si tabernáculos, morreram, foram ressucitados e receberam sua exaltação nos mundos redimidos sobre os quais haviam habitado. Estando disposta e ansiosa para imitá-los, esperando e desejando obter um corpo, uma ressurreição e também uma exaltação, e tendo obtido permissão, tu fizeste um convênio com um dos teus espíritos semelhantes para ser teu anjo da guarda enquanto na mortalidade, também com outros dois espíritos, homem e mulher, de que virias e tomaria um tabernáculo pela sua linhagem e tornar-se-ia sua descendência. Também escolhestes um espírito semelhante a quem amaste no mundo espiritual (e que também teve permissão para vir a este planeta e tomar um tabernáculo) para ser teu cabeça, apoio, marido e protetor na terra e exaltar-te nos mundos eternos. Tudo isso foi arranjado, assim como os espíritos que nasceriam por meio da tua linhagem. Almejaste, vislumbraste e oraste ao teu Pai no céu para chegar o tempo em que poderias vir a esta terra, que havia saído e caído de onde fora primeiramente organizada, próxima ao planeta Colobe. Com o tempo, chegou o momento e ouviste a voz de teu Pai dizendo: “vai, filha, habitar o mundo abaixo e tomar sobre ti um tabernáculo e operar teu estado probatório com temor e tremor e te levantar para a exaltação. Mas lembra, filha, que tu vais na condição de esquecer tudo o que já viste ou soubeste acontecer no mundo espiritual: não saberá ou lembrarás de nada concernente ao que viste ocorrer aqui; mas deves ir e tornar-se um dos seres mais indefesos que criei enquanto em tua infância, sujeita à doença, à dor, às lágrimas, ao luto, ao pesar e à morte. Mas quando a verdade tocar as cordas do teu coração, elas vibrarão; então, a inteligência iluminará tua mente e derramará seu esplendor em tua alma e começarás a compreender as coisas que antes sabias mas que se haviam ido; começarás, então, a entender e conhecer o objetivo da tua criação. Filha, vai e seja fiel como tens sido em teu primeiro estado”.
Teu espírito, repleto de alegria e gratidão, regozijou-se em teu Pai e rendeu louvor a seu santo nome, e o mundo espiritual ressoou em hinos de louvor ao Pai dos espíritos. Tu te despediste de teu Pai e tua Mãe e de todos e, junto com teu anjo da guarda, vieste a este globo perigoso. Tendo os espíritos que havias escolhido para tomar um tabernáculo pela sua linhagem e teu cabeça deixado o mundo espiritual alguns anos antes, vieste um espírito puro e santo. Tens obedecido a verdade e teu anjo da guarda ministra a ti e te guarda. Escolheste aquele que amavas no mundo espiritual para ser teu companheiro.
Agora, coroas, tronos, exaltações e domínios estão em reserva para ti nos mundos eternos e o caminho está aberto para retornares à presença do Pai Celestial, se apenas obedeceres e caminhares na lei celestial, cumprires os desígnios do teu criador e resistires até o fim, quando a mortalidade é posta na tumba, poderás descer à tua sepultura em paz, surgir em glória e receber tua recompensa eterna na ressurreição dos justos, junto com teu cabeça e marido. Será-te permitido passar pelos Deuses e anjos que guardam os portões, e adiante, e acima, para tua exaltação em um mundo celestial entre os Deuses. Para ser uma sacerdotisa e rainha no trono do teu Pai Celestial e uma glória para o teu marido e a tua descendência, para conceber as almas dos homens, povoar outros mundos (como concebeste seus tabernáculos na mortalidade), enquanto eternidades vêm e vão; e, se aceitares, senhora, isto é vida eterna. E aqui é cumprido o dito do Apóstolo Paulo de que “o homem não é sem a mulher, nem é a mulher sem o homem no Senhor”. “Que o homem é o cabeça da mulher e a glória do homem é a mulher.” Portanto, tua origem, o objetivo do teu destino supremo. Se fores fiel, senhora, a taça está ao teu alcance; bebe, então, do elixir celestial e vive.

Origin and destiny of woman, publicado originalmente no periódico The Mormon, em 29 de agosto de 1857, Nova York. Tradução de Antônio Trevisan Teixeira.

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Mulheres e o sacerdócio

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Não deixo de me sentir um pouco constrangido ao parabenizar as mulheres no dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher. Isso porque originalmente é uma data que tem mais a ver com denúncia e reivindicação do que com uma celebração em que se pode enviar flores. É mais ou menos como dar parabéns aos negros pelo Dia da Consciência Negra, ou aos indígenas pelo Dia do Índio. Soa um pouco irônico.

De qualquer forma, eu expresso a minha gratidão pelas mulheres que estão à minha volta e que tornam a minha vida bem mais rica e interessante,  numa sociedade que ainda abusa delas de tantas formas diferentes -física, emocional, espiritual. Será que participamos e perpetuamos algumas formas de abuso?

Entre nós, mórmons, há a percepção – pouco elaborada, geralmente -, de que a mulher partilha do sacerdócio com o seu esposo. No templo, mulheres administram ordenanças umas às outras – outro assunto sobre o qual pouco se reflete a respeito. Algumas pessoas, no entanto, entendem que ordenar exclusivamente homens ao sacerdócio é uma forma de manter a mulher subjugada.

Existe algum forma pela qual a mulher possua o sacerdócio sem ser a ele ordenada? Existem ordenações de mulheres a ofícios do sacerdócio? A Igreja sud um dia terá ordenações formais para as mulheres, assim como acontece hoje com os homens?

Para encerrar esta postagem, uma citação de Brigham Young:

Agora, irmãos, o homem que honra seu sacerdócio [his priesthood], a mulher que honra seu sacerdócio [her priesthood],receberão uma herança eterna no reino de Deus. (Brigham Young, Journal of Discourses 17:119)

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Doutrina sobre a Mãe Celestial é “redescoberta” na Igreja


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Uma posteridade branca e deleitosa: origens do casamento plural

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William W. Phelps

William W. Phelps

A crença na origem israelita dos povos ameríndios e a prática do casamento plural são certamente duas características marcantes da experiência mórmon. Embora nenhuma das duas tenha uma origem exclusivamente mórmon, Joseph Smith deu a elas aplicações e sentidos únicos. Poucos entre nós estão familiarizados, no entanto, com a conexão histórica entre as duas doutrinas; tampouco a influência do Livro de Mórmon na instituição do casamento plural parece ter sido avaliada com a devida consideração.

A primeira revelação conhecida a aludir à prática da poligamia (ainda que sem mencioná-la explicitamente) ordenava que um grupo de élderes em missão buscasse esposas indígenas para que sua descendência pudesse retornar a um estado de pureza e retidão, conforme profetizado no Livro de Mórmon. O casamento divinamente ordenado entre mórmons e índios seria o meio de tornar isso realidade.

No cabeçalho da seção 132 de Doutrina e Convênios, lê-se a afirmação de que “é evidente, pelos registros históricos, que as doutrinas e princípios envolvidos nesta revelação [de 1843, sobre o casamento celestial plural] eram do conhecimento do Profeta [Joseph Smith] desde 1831”. Embora durante o processo de tradução do Livro de Mórmon, Joseph Smith já tivesse se deparado com a questão da pluralidade de esposas [1] – o que antecederia para 1829 seu primeiro contato com tais “doutrinas e princípios”–, é significativa a menção de 1831, ano em que se vislumbram os primórdios do casamento plural mórmon. É nesse ano que Joseph e Emma vão para o estado de Ohio, onde Joseph conheceria a maior parte de suas futuras esposas plurais. É também de 1831 a revelação analisada a seguir.

Leia também: mitos populares mórmons sobre poligamia
 

Na região oeste do condado de Jackson, no Missouri, junto a um grupo de missionários que incluía Oliver Cowdery e William W. Phelps, Joseph Smith recebeu uma revelação em que Jesus Cristo os ordena a desposar mulheres dentre os indígenas. Uma vez que muitos dos missionários já eram casados, seguir o mandamento dado faria deles polígamos:

Em verdade, em verdade, diz o Senhor, vosso Redentor, o próprio Jesus Cristo, a luz e a vida do mundo que não podeis discernir com vossos olhos naturais, o desígnio e propósito de teu Senhor e teu Deus em trazê-los ao ermo, para uma prova de vossa fé – e para serdes testemunhas especiais para prestar testemunho desta terra, sobre a qual a Sião de Deus deverá ser construída nos últimos dias, quando for redimida.(…)

Em verdade vos digo que a sabedoria do homem, em seu estado decaído, não conhece os propósitos e privilégios do meu santo sacerdócio, mas vós sabereis quando receberdes uma plenitude em razão da unção; pois é minha vontade que, em tempo, deveis tomar para vós esposas dentre os lamanitas e nefitas, para que sua posteridade possa tornar-se branca, deleitosa e justa, pois mesmo agora suas mulheres são mais virtuosas do que as gentias. [2]

Embora não saiba quantos naquele momento de fato tentaram seguir a admoestação divina ou que sucesso obtiveram, essa constitui a primeira revelação moderna de que se tem registro em que a pluralidade de esposas é aludida. É interessante que antecedendo o mandamento de unir pelo matrimônio mórmons e indígenas haja a referência inicial à futura cidade de Sião, já que de acordo com desenvolvimentos doutrinários posteriores, a Nova Jerusalém seria construída conjuntamente pelos santos dos últimos dias e os lamanitas. [3] Afinal, os indígenas são vistos como indivíduos “mais virtuosos” do que os norte-americanos brancos, sendo a posteridade de antepassados hebreus que haviam colonizado o continente.

As mulheres indígenas serem consideradas “mais ‘virtuosas’ do que mulheres gentias contemporâneas é surpreendente”, afirma o historiador C. Carmon Hardy, “dada a percepção comum, datando do período colonial” de uma suposta imoralidade sexual entre as indígenas. [4] Isso de fato nos faz questionar a posição de alguns autores, como Fawn Broadie, por ex., que consideram que as visões raciais mórmons não diferiam daquelas predominantes nos EUA entre sua população branca do séc. XIX, em que indígenas estavam acima dos negros numa imaginada escala de moral e inteligência. Ainda que não possamos ignorar a influência cultural de seu lugar e época, a visão mórmon sobre os indígenas dificilmente poderia ser encaixada com perfeição no paradigma cultural norte-americano da época. Como lembra Richard Bushman, de acordo com o Livro de Mórmon, “os índios, alvos de preconceito, são também os verdadeiros proprietários das terras, aos quais os gentios devem se juntar ou perecer”. [5]

O mandamento de desposar as mulheres “lamanitas e nefitas” é exposto como um dos “privilégios do meu santo sacerdócio”, ainda não compreendidos pela Igreja. A ideia do casamento plural como um privilégio ou lei terá eco por toda a história da prática. [6] O entendimento futuro sobre tal lei viria de uma “plenitude da unção”, sugerindo novamente que a compreensão dos santos sobre o sacerdócio era ainda incompleto. Uma década depois, começaria a se desenvolver de forma explícita o conceito de que o casamento plural é um dos elementos que constituem a plenitude do evangelho. [7]

O propósito da união com as mulheres indígenas, de acordo com o texto da revelação é que “sua posteridade possa tornar-se branca, deleitosa e justa”. Aqui surge claramente um eco do Livro de Mórmon, em que a profecia sobre a futura restauração da casa de Israel a seu antigo status e relacionamento com Deus inclui a descendência dos antigos habitantes das Américas:

E então os remanescentes de nossa semente terão conhecimento de nós (…).

E o evangelho de Jesus Cristo será proclamado a eles; portanto o conhecimento sobre seus pais lhes será restituído, como também o conhecimento sobre Jesus Cristo, que seus pais possuíam.

E aí se regozijarão; (…) e antes que se passem muitas gerações, tornar-se-ão um povo branco e agradável. [8]

Essa transformação da aparência física dos lamanitas ocorre em dado momento da narrativa do Livro de Mórmon, quando a sua conversão os leva a se unirem aos nefitas. Como resultado dessa união, “seus filhos e filhas tornaram-se sumamente belos”, uma afirmação que sugere a união entre lamanitas convertidos e nefitas como algo também físico, através do matrimônio entre as duas linhagens:

E acontecei que os lamanitas que se haviam unido aos nefitas foram contados com os nefitas;

E a maldição foi retirada deles e sua pele tornou-se branca como a dos nefitas;

E seus filhos e filhas tornaram-se sumamente belos e foram contados com os nefitas. (…) [9]

Ao ordenar que missionários brancos desposassem mulheres descendentes dos antigos “lamanitas e nefitas”, a revelação de 1831 não apenas retoma a profecia de que sua posteridade seria novamente “branca e deleitosa”, mas ordena o meio para que viesse a acontecer, com paralelos que podem ser traçados com a narrativa do Livro de Mórmon. A revelação não foi publicada em Doutrina e Convênios ou nos periódicos da Igreja, de modo que nunca se tornou de conhecimento comum dos membros ou autoridades gerais. O texto da revelação que chegou até nós é parte de uma carta escrita por William W. Phelps, narrando os fatos acontecidos 30 anos antesendereçada a Brigham Young.

Tendo tomado conhecimento da doutrina exposta na revelação através da carta de Phelps ou em outro momento anterior, o fato é que algumas doutrinas ensinadas por Brigham Young no oeste sugerem que ele também acreditava no princípio de trazer uma posteridade “branca e deleitosa” para os indígenas, embora o pragmático Brigham Young não tivesse estabelecido uma relação com os indígenas desprovida de muitas ambiguidades. Muito da atitude mórmon no território de Deseret não estava imune ao sentimento de superioridade compartilhado pelos “gentios” em relação aos povos indígenas. Mesmo assim, a miscigenação com as tribos locais foi buscada.
A seguinte observação de T. B. H. Stenhouse, em seu livro de 1873, mesmo que repleta de ironia, parece ser verossímil sobre a aplicação do mesmo princípio exposto na revelação de 1831, décadas depois, por parte do apóstolo Heber C. Kimball no proselitismo entre os indígenas do oeste:

Ele [Brigham Young] enviou certa vez uma missão para Fort Linahi, Salmon River. (…) Quando Brigham e Heber depois visitaram os missionários para ver que sucesso estavam tendo, Heber, em seu estilo peculiar, lhes disse que não via como as predições modernas poderiam ser cumpridas sobre os índios se tornarem “um povo branco e deleitoso” sem estender a poligamia aos nativos. A chegada do exército dos Estados Unidos, em 1857, contribuiu para acabar com aquela missão, mas não antes da sugestão de Heber ter sido claramente compreendida e a profecia meio cumprida! Heber era muito prático e acreditava que as pessoas nunca deveriam pedir “ao Senhor” para fazer por elas aquilo que poderiam fazer por si mesmas e, uma vez que toda Israel estivera orando para que os índios se tornassem prontamente um “povo branco e deleitoso”, ele pensava ser dever dos missionários auxiliar “o Senhor” a cumprir suas promessas. (…) Mais de um missionário parece tê-lo entendido perfeitamente! [10]

Pela revelação de 1831, percebe-se que um importante elemento do Livro de Mórmon estava relacionado ao início da história do casamento plural. O fato pode ser surpreendente para os que, numa leitura rápida, se acostumaram a ver na narrativa de Jacó uma condenação da poligamia. A necessidade que sentiam os pioneiros de cumprir a profecia do registro nefita e agir pela salvação da posteridade de Leí, para que voltasse a ser “branca, deleitosa e justa”, lançava os alicerces do que ainda viria a ser um dos fundamentos da religião dos santos dos últimos dias, o casamento plural.

A doutrina sobre o selamento ou a eternidade do matrimônio ainda estava muito longe de ser revelada ou desenvolvida; o texto da revelação, porém, aponta para um tempo futuro em que seria revelada uma “plenitude” e os “privilégios do sacerdócio” seriam ensinados e vividos, abrindo espaço para futuros desenvolvimentos e releituras. O entendimento histórico da revelação aqui analisada mostra como a doutrina do casamento plural já era vislumbrada no início da Igreja de modo muito mais concreto do que se imaginava.

Leia mais sobre história mórmon: batismo para cura
 

NOTAS

[1] Em Jacó 2:22-35, a prática desautorizada do casamento plural é condenada. É feita a afirmação de que “se eu [o Senhor] quiser suscitar posteridade para mim, (…) ordenarei isso ao meu povo” (versículo 30).

[2] Revelação dada por intermédio de Joseph Smith, no Condado de Jackson, Missouri, em 17 de julho de 1831. Relatada por William W. Phelps em carta a Brigham Young, em 12 de agosto de 1861. Collier, Fred. Unpublished revelations, 10:4, p.58. Leia aqui o texto completo da revelação em português.

[3] Em muitas afirmações, os lamanitas são os principais responsáveis pela construção de Sião, enquanto os efraimitas brancos têm um papel coadjuvante. Ver, por exemplo, Orson Pratt, Journal of Discourses 9:178, em julho de 1855: “Acredito com todo meu coração (…) que este povo será nosso escudo em dias futuros. (…) Vocês não sabem que (..) aqueles que abraçam o Evangelho dentre os gentios terão o privilégio de ajudar os lamanitas a construir a cidade chamada de Nova Jerusalém?”.

Falecido em 2010, o ex-setenta George P. Lee, de origem navajo, questionava a hierarquia sud no que se referia ao abandono desta e de outras doutrinas relativas aos indígenas.

[4] Hardy, C. Carmon. Doing the works of Abraham. Arthur C. Clark, 2007, p. 35.

[5] Bushman, Richard Lyman. Joseph Smith: rough stone rolling. Alfred A. Knopf, 2005, p. 99.

[6] D&C 132:58,64 fala da pluralidade de esposas como “a lei de meu sacerdócio”. O uso da palavra “privilégios” também é comum entre os relatos dos primeiros poligamistas mórmons para se referirem à prática.

[7] D&C 132:6: ”E quanto ao novo e eterno convênio, foi instituído para a plenitude de minha glória; e aquele que recebe sua plenitude deve cumprir a lei e cumpri-la-á; caso contrário, será condenado, diz o Senhor Deus”.

[8] 2 Néfi 30:4-6. Já antes de 1978, a edição sud do Livro de Mórmon havia mudado “branco e agradável” para “puro e agradável”, como consta na edição atual. Outra mudança se de em dezembro de 2010, quando algumas referências raciais foram removidas de alguns cabeçalhos de capítulos do Livro de Mórmon. Os cabeçalhos não são originalmente parte do Livro de Mórmon. Várias referências à pele clara ou escura de nefitas e lamanitas permanecem na narrativa em si.

[9] 3 Néfi 2:14-16.

[10] The Rocky Mountain saintsp. 657-659.


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Mórmons que se candidataram à presidência dos EUA

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Mitt Romney não é o primeiro mórmon a almejar a  presidência dos Estado Unidos. Antes dele, outros oito mórmons tentaram a corrida presidencial, sem contar outros dois que à época de sua candidatura não eram membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Começando com Joseph Smith, que concorreu sem filiação partidária, os candidatos listado a seguir refletem a ampla diversidade de posições politicas ao longo da história mórmon.

1844 Joseph Smith Jr. (sem partido) - depois de buscar sem sucesso proteção política entre presidenciáveis democratas e republicanos, Joseph Smith veio a ser o primeiro líder religioso a concorrer à presidência de seu país. Baseada em sua visão de uma teodemocracia, sua plataforma política incluía a abolição da escravatura,  a transformação das prisões em centros educacionais para os detentos e a anexação da então República dos Texas aos EUA. Seu candidato a vice-presidente era o também mórmon Sidney Rigdon. Ao mesmo tempo que fazia sua campanha eleitoral, o Conselho dos 50 buscava alternativas para a migração em massa dos santos dos últimos dias, para fora dos EUA, alternativa que veio a ser a única concretizada após o término  abrupto de sua campanha em 1844, quando Joseph Smith se tornou o primeiro candidato à presidência dos EUA a ser assassinado.

1920 Parley P. Christiansen (extinto Partido Trabalhista-Agrário) – filho de imigrantes dinamarqueses que se fixaram em Idaho, Christiansen exerceu a advocacia em Salt Lake. No período da I Guerra Mundial, defendeu militantes presos por sua oposição ao envolvimento americano no conflito. Após passar pelos partidos Republicano e Progressista, Christiansen passou a atuar junto aos diversos grupos de esquerda em Utah que levariam à formação do novo partido trabalhista pelo qual concorreu à presidência. A eleição de 1920 foi a primeira em que mulheres tiveram o direito ao voto nos 48 estados americanos. A candidatura de Christiansen recebeu em todo país 265.411 votos (quase 1% do total de votos). Em Utah o percentual foi de 3,07%. Suas maiores votações foram nos estados de Washington e Dakota do Sul, com mais de 19% em cada um.

1968 George W. Romney (Partido Republicano) – pai do atual candidato Mitt Romney, George Romney é descendente de polígamos que migraram para colônias mórmons no México fugindo da perseguição federal nos EUA. Fazendo o caminho inverso, George Romney nasceu no México e migrou para os EUA aos 5 anos. Tornou-se um empresário bem-sucedido e foi governador do estado do Michigan. Durante sua candidatura à nomeação republicana, sua mudança de posição acerca da Guerra do Vietnã (de favorável a contrário) o tornou impopular no partido e acabou por fortalecer seu concorrente Richard Nixon. Enquanto hoje muitos americanos questionam se Romney “receberia ordens” de Salt Lake, George Romney nunca levantou essa suspeita. Defensor dos direitos civis para os negros, George Romney era visto como um republicano liberal e politicamente independente da hierarquia sud.

1968 Ezra Taft Benson (Partido Americano Independente) – como membro do Quórum dos Doze, Benson pregava ardentemente contra o perigo do comunismo e do movimento por direitos civis, chegando a promover a espionagem de alunos e professores da BYU para detectar possíveis liberais e esquerdistas. Benson foi ministro de agricultura do presidente Eisenhower. Em 1968, aceitou a nomeação do direitista Partido Americano Independente para concorrer à presidência dos EUA, tendo como vice Strom Thurmond, um defensor da segregação racial. Devido às repercussões negativas de sua candidatura, o então presidente da Igreja David O. McKay o convenceu a abandonar a corrida presidencial. Mais tarde, como presidente da Igreja sud, Benson já não expressava a antiga retórica radical.

1976 Morris K. “Mo” Udall (Partido Democrata) – Morris Udall vinha de uma família mórmon com reconhecida influência política no estado do Arizona. As políticas raciais defendidas pela Igreja sud à época fizeram com que Udall entrasse em desacordo com a hierarquia de Salt Lake. Udall também foi um crítico ativo da intervenção militar no Vietnã. Nas primárias do Partido Democrata de 1976 teve um ótimo desempenho, ficando atrás porém de Jimmy Carter, eleito presidente naquele ano.

1992 James G. “Bo” Gritz (Partido Populista) – coronel aposentado das Forças Especiais, Gritz sempre gostou de polêmicas e teorias conspiratórias, como sugere a foto ao lado em que queima a bandeira da ONU. Ele já acusou membros do governo Reagan de facilitar o narcotráfico no Laos, esteve envolvido com milícias, protestou contra a Guerra do Golfo em 1991 e até hoje ministra cursos de técnicas paramilitares. Havia se filiado à Igreja sud em 1982. Concorreu à vice-presidência em 1988 ao lado de um ex-líder da Ku Klux Klan, desistindo logo após. Em 1992, foi candidato à presidência, recebendo 106.152 votos, correspondendo a apenas 0,14% dos votos no país. Mas em Utah e Idaho, os percentuais foram de 3,84% e 2,13% respectivamente. Após suaa campanha, pediu a resignação de sua condição de membro, devido a conflitos envolvendo sua rejeição em pagar impostos federais.

2000 Orrin G. Hatch (Republicano) – apesar de ter no início de sua militância política uma inclinação trabalhista, Orrin Hatch juntou-se à ala mais à direita dos republicanos. Como membro do congresso americano, esteve envolvido na formulação de leis anti-terrorismo e na aprovação de ajuda estatal para a sobrevivência de instituições financeiras (no estilo PROER brasileiro). Nas prévias republicanas de 2000 que escolheram George W. Bush, Hatch obteve a menor votação e a menor arrecadação de fundos, atribuindo ao preconceito anti-mórmon parte de seu insucesso.

2012 John Huntsman (Republicano) – neto do apóstolo David B. Haight, o californiano John Huntsman iniciou sua carreira política trabalhando na Casa Branca com o presidente Ronald Reagan. Huntsman também trabalhou com George Bush pai. Entre 2005 e 2009, foi governador de Utah. Nas prévias republicanas de 2008, foi um dos primeiros apoiadores de John McCain, ignorando seu correligionário Mitt Romney. Com posições moderadas e fluência em mandarim, em 2009 Huntsman foi nomeado embaixador na China pelo presidente Obama (democrata). Esse fato esteve presente na troca de farpas entre Huntsman e Romney nesta campanha eleitoral. “A pessoa que deve representar o nosso partido concorrendo contra o presidente Obama não é alguém que o chamou de um líder notável e foi ser seu embaixador na China ”, disse Romney. A resposta de Huntsman não deixou por menos: ”Eu sou alguém que acredita em colocar o meu país em primeiro lugar. Romney aparentemente acredita na política em primeiro lugar”. Apesar de serem membros do mesmo partido e da mesma igreja, os dois possuem visões-de-mundo muito diferentes.  Após a declaração de Romney sobre gostar de despedir pessoas, em janeiro passado, Huntsman chegou a dizer que seu companheiro de partido era “bastante inelegível”. Apesar disso, o ex-embaixador abandonou a disputa eleitoral e declarou seu apoio a Romney.

Um futuro mórmon e uma mórmon que havia sido excomungada

1968 Eldridge Cleaver (Partido Paz e Liberdade) – antes de sua conversão ao mormonismo, Eldridge Cleaver foi um militante de extrema esquerda. Sua candidatura à presidência teve o apoio dos famosos Panteras Negras. Em meio a todo o conflito do ano de 68, Martin Luther King Jr. havia sido morto, o que apenas acirrou a tensão racial nos EUA. Após sua conversão, Cleaver filiou-se ao Partido Republicano.

1984 Sonia Johnson (Partido dos Cidadãos) – doutora em educação, Sonia Johnson lecionou inglês em universidades dos EUA e exterior. Uma ativista pelos direitos da mulher, criticou o lobby da Igreja sud para impedir a aprovação da ERA (Equal Rights Amendment – Emenda de Direitos Iguais), uma emenda constitucional propondo que a igualdade de direitos não pudesse ser negada em função do gênero, e formou a organização Mormons for ERA. Tal posicionamento trouxe a sua excomunhão em 1979.  Sonia Johnson, declarou dois anos depois que “se [as ordenanças] são necessárias, eu as tenho intactas“. Sua candidatura presidencial teve também o endosso do Partido Socialista dos EUA e do Partido Paz e Liberdade.

Leia ainda: Crescimento da Igreja Mórmon?

Saiba mais sobre a próxima Conferência Brasileira de Estudos Mórmons

 


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Mãe e solteira

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Quais os problemas enfrentados por mães divorciadas ou solteiras dentro da Igreja sud? Há preconceito contra essas mulheres? O que pode ser feito para que sejam melhor recebidas e tenham plena cidadania na Igreja?

Numa instituição que valoriza a família tradicional e que percebe o casamento e a paternidade e maternidade como passos para a deificação, sabemos que podem surgir certos “efeitos colaterais”: ser solteiro, por exemplo, pode ser algo socialmente incômodo para membros que há tempo deixaram a adolescência. Isso também afeta fortemente aqueles que são divorciados, pois ainda que o divórcio tenha sido a última saída para a solução de sérios problemas, o divórcio é geralmente representado na Igreja como um problema em si e os divorciados, pessoas que não perseveraram até o fim. E, claro, solteiros ou divorciados que são pais e mães parecem se distanciar ainda do ideal de família tradicional representado pelas fotos da Liahona.

Quando muitos se preparam para celebrar o dia das mães, eu me questiono como é ser mórmon, mãe e solteira. Evidentemente, não é uma experiência que eu possa viver e falar a respeito. Mas nem por isso isso me preocupa menos. A extrema habilidade que nossas congregações (alas ou ramos) têm para excluir pessoas, somada a padrões familiares idealizados por muitos mas alcançados por poucos em nossos dias, estariam fazendo das mães solteiras e divorciadas as vítimas preferenciais do conjunto de fatores que afasta os membros da Igreja?

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“O Evangelho da Esposa de Jesus”

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Papiro copta faz referência à esposa de Jesus Cristo

Uma historiadora da Universidade de Harvard, especializada em cristianismo primitivo, identificou um pequeno fragmento de papiro em que Jesus Cristo é citado falando de sua esposa. A Dra. Karen L. King e sua equipe trabalharam sobre o pequeno fragmento de apenas oito linhas, partindo da ideia de que poderia ser uma fraude. Mas a conclusão unânime foi de que não era. O fragmento de “O Evangelho da Esposa de Jesus”, como foi nomeado o texto, é um documento autêntico em um dialeto do copta, idioma egípcio escrito com caracteres gregos, provavelmente do séc. IV.  O recorte do fragmento faz com que nenhuma frase esteja completa. Mas em meio à narrativa de um debate entre Cristo e seus discípulos, é possível ler “Jesus disse a eles: ‘Minha esposa…’”. Essa é a primeira alusão na primeira pessoa ao matrimônio de Cristo em um evangelho apócrifo. Logo abaixo, lê-se “e ela será capaz de ser minha discípula”.

Ao contrário do que foi dito ontem no telejornal de maior audiência no Brasil, a Dra. King declarou em entrevista ao New York Times que não considera o papiro como um prova de que Jesus tenha sido casado. Como historiadora (e não teóloga) analisando um texto (e não o homem histórico do qual ele fala), ela considera o texto como uma evidência de que existia entre os cristãos dos primeiros séculos a crença de que Cristo havia se casado. Essa é uma diferença importante, em termos acadêmicos, especialmente tendo em mente a possível datação do documento e o fato de que nesse mesmo período um autor cristão faz a afirmação de que Jesus não era casado.

De acordo com a pesquisadora, o próprio estado precário do fragmento pode ter sido resultado dos acirrados debates em torno da vida pessoal de Cristo e suas implicações para os cristãos:

É possível que a referência explícita ao estado civil de Jesus (…) tenha sido jogada numa pilha de lixo não (apenas?) porque o papiro em si estivesse gasto ou estragado, mas porque as ideias que continha iam tão fortemente contra as correntes ascéticas para onde corriam as práticas e entendimentos cristãos do casamento e intercurso sexual? Talvez. Nunca saberemos com certeza. (“Jesus said to them, ‘My wife…“, penúltima página)

Aqui o passado parece falar ao presente, uma vez que o universo religioso hoje também debate questões relacionadas a casamento, gênero e sexualidade. E até mesmo a cultura popular reflete e promove esse debate. O Código Da Vinci causou polêmica em anos recentes ao falar de Jesus Cristo ter sido casado e deixado descendentes. Tal debate poderá ser reaceso com a tradução do novo papiro copta? A referência errada no Jornal Nacional já nos indica o potencial de excitar a imaginação de muitos.

Para os santos dos últimos dias, esse debate tem uma enorme relevância, dado o fato de que Joseph Smith foi um proponente da ideia de Cristo ser casado, além da história mórmon nos mostrar o papel mais ativo que mulheres já tiveram no passado, impondo as mãos sobre doentes ou falando em línguas. Será que a pesquisa acadêmica nos ajudará a apreciar melhor  ensinamentos já varridos para baixo do tapete?

Não estou certo sobre as possíveis repercussões dessa recente descoberta no mundo mórmon. Ou mesmo para o cristianismo em geral. Talvez não haja nenhuma mudança de percepção. Afinal, há um grande vácuo entre o que transcorre no mundo acadêmico e o que se ensina nas igrejas. Mas torço para que pesquisas como a da Dra. King possam, ao menos, nos traçar um retrato ainda mais claro do rico e tumultuado cristianismo dos primeiros séculos.


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Prepare-se para a IV Conferência Brasileira de Estudos Mórmons

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Você já se agendou para a IV Conferência Brasileira de Estudos Mórmons? Ela acontece no dia 19 de janeiro de 2013, em São Paulo.

O tema da Conferência de 2013 será “A Relação entre Sede e Periferia na Igreja SUD”.

A Conferência é gratuita e aberta a todos os interessados. Não é necessária inscrição prévia, havendo um cadastramento no dia.

O local é o espaço de eventos MyJobSpace, localizado na Av. Eng. Armando de Arruda Pereira. 345 – Sobreloja. São Paulo.


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Machismo no Mormonismo

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Anotem a data: 16 de Dezembro de 2012 é dia das mulheres da Igreja SUD irem às reuniões dominicais vestindo calças!

A campanha ‘Vista Calças Para Sacramental’ foi organizada por um grupo de mulheres SUD ativas que, apesar de valorizar a Igreja em suas vidas, sente-se discriminadas dentro de uma cultura religiosa patriarcal:

Cremos que muito da inigualdade cultural, estrutural, e mesmo doutrinária que persiste na Igreja SUD hoje em dia advém da dependência de — e persistência em — modelos de genêro rígidos que não tem qualquer relação com a realidade.

Vista Calças Pra Sacramental

A opção de vestuária pode parecer uma questão absolutamente trivial e inconsequente, mas infelizmente ela é uma pequena amostra — a proverbial ponta do iceberg — do que é um assunto muito não-trivial e importante.

A Igreja SUD e a cultura Mórmon são, fundamentalmente, machistas.

Dizem que o primeiro passo para se mudar um problema é admitir sua existência.

Algum tempo atrás, num fórum de discussão online para Mórmons, eu mencionei o assunto de poligamia e como essa instituição social impacta negativamente mulheres, quando eu recebi um email com a acusação mais estúpida ridícula que eu já li contra sobre mim: eu sou machista por me opor à poligamia! O raciocínio e a lógica deste jovem SUD chega a ser tão distorcida pela cultura patriarcal onde se insere que, pra ele, é machismo esperar que mulheres tenham os mesmos direitos sociais e culturais que os homens!

Eu imagino que seja muito difícil para a maioria dos Mórmons, especialmente para os homens, compreender o quão machista a cultura Mórmon é, e portanto, gostaria de demonstrar com alguns casos específicos. Eu já sei que alguns reclamarão que os exemplos são apenas anedotas pontuais, como que as exceções à regra. Fosse esse o caso, jamais me ocorreria de acusar (ou de me queixar) dessa atitude machista endêmica, compreendendo que qualquer agremiação de pessoas trará consigo alguns indivíduos que resistem as características básicas do grupo.

Não. Esses exemplos que seguem servem apenas para ilustrar um contexto maior, e ao meu ver, negativo. Ademais, gostaria de levantar uma breve introdução ao contexto histórico e cultural Mórmon para demonstrar, ou ao menos sugerir, que a raíz do problema é, de verdade, institucional e que, possívelmente, só pode ser resolvido institucionalmente.

Nos “Padrões”

Em Fevereiro de 2012, uma aluna da BYU (universidade oficial da Igreja SUD) estudava na biblioteca da faculdade quando recebeu um bilhete de um colega estudante desconhecido. O bilhete continha uma forte reprimenda para a aluna, queixando-se que “[as roupas] que [ela] vestia tinham um efeito negativo nos homens… ao seu redor” e exortava-a a pensar no bem estar emocional e espiritual dos demais alunos Mórmons da BYU. [1]

A jovem aluna Mórmon, além de postar uma foto do bilhete, publicou uma foto de si mesma com as roupas que tanto escandalizaram o jovem estudante Mórmon:

Assim ela não deixa nada para a imaginação!

Assim ela não deixa nada para a imaginação!

Vamos ignorar aqui a completa falta de educação de uma pessoa se julgar na “autoridade” de comentar, gratuitamente, sobre a espiritualidade de outra. Ou de um homem criticar a roupa de uma mulher desconhecida. Duas coisas chamam a atenção imediata nesse episódio: 1) O jovem estudante acredita que é responsabilidade da jovem aluna, baseado em como se veste, os sentimentos que afloram nele — e em demais homens; 2) O jovem estudante acredita que a qualidade pessoal (espiritual, emocional, etc.) da jovem aluna esta intrinsicamente ligada às roupas que ela veste.

Goste ou não do rótulo, o jovem SUD exibiu uma atitude indubitavelmente machista. À mulher não cabe a responsabilidade sobre os sentimentos ou pensamentos de um homem; à ele recai tal responsabilidade, e imputa-la às mulheres é impor-lhes um fardo absurdo e injusto. Igualmente, o caráter de uma mulher não depende de suas roupas, assim como a qualidade de um livro não depende de sua capa.

Contudo, o mais preocupante nessa postura é a objetificação da mulher, que leva a modular como se trata uma pessoa baseado em seus atributos físicos, sua aparência, seu corpo.

Certamente, essa atitude problemática não é exclusividade Mórmon. Há algum tempo atrás, a Secretária de Estado Hillary Clinton — a segunda pessoa com maior autoridade no alto escalão da diplomacia Norte-Americana, atrás apenas do Presidente dos Estados Unidos — se irritou durante uma entrevista no Quirguistão, quando questionada sobre suas preferências de roupas, e retrucou:

Você teria me feito essa mesma pergunta se eu fosse um homem? [2]

E essa é justamente a melhor ferramenta para se determinar se uma atitude é machista ou não: ela teria sido tomada da mesma maneira caso a outra pessoa fosse um homem, ao invés de uma mulher?

Em Maio de 2012, uma mãe de Tooele, Utah, recebeu uma ligação da administração da escola avisando-a para vir buscar sua filha de 14 anos, que havia sido suspensa por “estar vestida de maneira inapropriada para um ambiente escolar”. Ela havia sido suspensa pelo diretor da escola por estar “indecente”. [3]

Contudo, a mãe coincidentemente portava uma câmera digital e registrou o vestuário da filha ainda na escola:

Se lá em casa as roupas fossem todas assim, acabariam-se todos os dramas!

Se lá em casa as roupas fossem todas assim, acabariam-se todos os dramas!

Novamente, um diretor escolar (supostamente Mórmon) enxergou uma jovem (neste caso, uma aluna menor de idade) apenas por seus atributos físicos — um metafórico pedaço de carne — e esta lente simplesmente deturpou sua visão dela como Ser Humano de tal maneira a lhe “autorizar” a humilha-la publicamente de maneira completamente desproporcional, desmedida, e irracional.

Contudo, a objetificação da Mulher não é restrito apenas a homens, da mesma maneira que machismo não é domínio exclusivo deles.

Há alguns meses atrás, circularam-se fotos pela internet de “dicas” para bonecas Barbie® que, para incentivar modéstia e decência em meninas, estariam pintadas para “cobrir sua nudez” com marcações curiosamente similares aos da Investidura (i.e., Garments)! [4]

Será que vão lançar essa versão da boneca nas lojas da Deseret?

Será que vão lançar essa versão da boneca nas lojas da Deseret?

A sexualização precoce de crianças é, sem sombras de dúvida, um problema, tanto cultural para a sociedade em geral, como psicológica para cada menina individualmente. Danças com passinhos eróticos ou programas de novela e televisão com temas sexuais ou adultos podem causar distorções de comportamento e problemas para uma vida inteira quando gravadas em mentes jovens e permeáveis. Não obstante, a obsessão com o tema de sexualidade para crianças e pré-adolescentes, mesmo que para “indoutrina-las” para o oposto, é igualmente danoso e pelos mesmos motivos: encurta-se um período infantil de desenvolvimento neuro-psico-cognitivo para saltar para outro período, sem as ferramentas psico-emocionais adequadas.

A objetificação da Mulher, focando acima de tudo na sua aparência física, seja por homens colegas, homens líderes, ou mesmo mulheres adultas em posição de liderança (i.e., mães, professoras, etc.) despersonaliza a Mulher, e a expõe e relega a situação inferiorizada na sociedade. Mulheres são muito mais que apenas as roupas que vestem ou como as vestem, e devem ser valorizadas baseado no conjunto agregado de suas personalidades, seus valores pessoais, suas inteligências e habilidades, e nas suas capacidades como seres humanos.

Nos “Padrões” Institucionais

O problema da objetificação da Mulher não é nem recente, nem incomum, e ele é reforçado e incentivado pela complacência institucional.

No ano passado, um docente da BYU começou a proibir alunas de fazer provas se estivessem vestindo jeans de um corte específico (o tipo skinny). No mesmo ano, uma estória infantil inteiramente bizarra publicada na revista oficial da Igreja ‘Friend’, e ainda disponível do site oficial da Igreja, lauda uma mãe que ensina a uma menina de 4 anos que um vestidinho sem mangas é “imoral”. Recentemente, uma colunista para o jornal oficial da Igreja ‘Deseret News’ opinou que o ideal para mulheres é casar-se cedo e entupir sua casa de filhos com o argumento absurdo de que o mundo “apresenta escolhas demais” e, ao casar-se e ter filhos, a mulher “limita suas escolhas” de vida e isso é bom porque, com menos opções, ela terá menos “ansiedade… altas expectativas… e depressão”. E, não contente em indoutrinar as jovens e as mulheres de que elas sejam culpadas e responsáveis pelos impulsos sexuais dos homens, a revista oficial da Igreja ‘Ensign’ chega a extremos de dessacrar pinturas clássicas para reforçar esta mentalidade.

Pelo menos a Dona Cecília Gimenez fez sucesso mundial e aumentou a arrecadação financeira da igreja dela!

Ao menos a Dona Cecília Gimenez fez sucesso mundial e aumentou a arrecadação financeira da igreja dela!

Mas nada se compara às expressões proferidas dos púlpitos máximos do Mormonismo. Em plena Conferência Geral, a Presidente Geral da Sociedade de Socorro Julie Beck deu um discurso tão machista (reforçando esteriótipos de que uma boa mulher é aquela que casa-se, limpa a casa, e tem muitos filhos) que desencadeou uma onda de protestos de várias mulheres (e homens) SUD.  Na década de 1970, um dos Bispos Presidentes Vaughn Featherstone defendeu em Conferência Geral um Bispo que, como conselho espiritual para uma adolescente cheia de problemas psicológicos e de auto-estima (lembrando: tratava-se de uma adolescente!), ofereceu esta pérola: “você esta gorda demais, e precisa perder peso!” [5][6][7][8][9][10]

Para mim, pessoalmente, a atitude se ilustra perfeitamente em um evento específico da minha vida. Em 14 de Novembro de 1996, eu tomei um ônibus junto com toda a minha Ala e viajamos 2 horas para ouvir o Presidente da Igreja Gordon Hinckley no Estádio Cícero Pompeu de Toledo. Com uma audiência de dezenas de milhares de membros, muitos dos quais viajaram horas, como nós, para vê-lo, Hinckley admoestou os Brasileiros sobre como viver uma vida Cristã plena. Entre os seus conselhos, uma mensagem clara para as mulheres: casem-se cedo, tenham filhos cedo, abandonem quaisquer carreiras profissionais e dediquem-se à carreira de dona-de-casa.

Na viagem de volta, tive uma conversa longa com uma de minhas melhores amigas na época sobre justamente isso. Ironicamente, ela não se dava conta do quanto ela era o exemplo de vida real perfeito de que Hinckley estava errado. Jovem e com dois filhos pequenos, ela era muito mais inteligente, capaz, e determinada que seu marido, mas viviam sempre com problemas financeiros porque ela não “podia” ter uma carreira e “devia” ter mais filhos, mais cedo do que eram financeiramente capazes de suportar.

Contexto Histórico

A história do Mormonismo é, inteiramente, escrita sobre um patriarcado machista. Com raras exceções, os grandes eventos, as grande decisões, e os grandes personagens do Mormonismo involvem exclusivamente homens.

Pode-se dizer o mesmo da história do mundo. Até o século XX, a humanidade havia sido, via de regra, dominada por homens que subjulgavam as mulheres. De modo geral, a tradição judaica tratava mulheres como propriedade e pessoas de valor secundário (ver Bíblia Hebraica ou “Velho Testamento” inteira), e a tradição Cristã tratava mulheres como subordinadas e menos relevantes (I Co 11:3-5, Ef 5:22, I Tm 2:5-14, II Tm 2:8-15). O mundo Ocidental do século XIX, onde o Mormonismo nasceu, havia progredido pouco, e portanto ele encaixava-se dentro de seu contexto cultural fiel e normalmente (resquícios misóginos persistem no Cristianismo até hoje). [11]

Não obstante, a Igreja passou a distanciar-se do resto da sociedade autóctona. Joseph Smith introduziu poligamia, visto como uma prática barbárica por quase todo o mundo Cristão e, junto com poligamia, vieram todos os problemas sócio-culturais comuns para comunidades poligâmicas: pobreza, isolacionismo, solidão, violência, dependência, e abusos. [12]

Alguns apologistas ignorantemente apontam o pioneirismo do sufrágio feminino (i.e., legalizar o direito a votar para mulheres) em Utah como sinal do quanto a Igreja era “progressista” e não machista. Nada poderia estar mais longe da verdade. Nesta época de intensas batalhas legais para criminalizar a poligamia, Anti-Mórmons pressionavam pelo sufrágio feminino em Utah na esperança de que as mulheres, oprimidas, passariam a se defender eleitoralmente do julgo patriarcal. A Igreja (ou melhor, os líderes homens da Igreja), por sua vez, desesperada para conseguir a legalização — ou impedir a criminalização — da poligamia, enxergou no sufrágio feminino uma oportunidade para passar uma imagem nacional diferente daquela retrógrada e bárbarie enraízada no inconsciente público. [13]

Abandonando a poligamia em 1904, a Igreja passou a gozar novamente de uma posição “normal” relativo a sociedade em geral no que diz respeito ao tratamento de mulheres, especialmente com os sucessos dos movimentos para sufrágio feminino no início do século XX. Contudo, essa harmonia começou a erodir com a migração das mulheres para o mercado de trabalho com os adventos da II Guerra Mundial (1939-1945) e a Segunda Onda Feminista (1960-1980) e a insistência da Igreja em proibir o uso de contraceptivos e desencorajar a profissionalização das mulheres. Novamente, a Igreja encontrava-se na posição desconfortável de se ver tratando suas mulheres de maneira menos justa, menos equânime, e menos iluminada que a sociedade autóctona.

A situação piorou muito, antes de melhorar! Em 1972, no meio do furor da Segunda Onda Feminista, o Congresso Americano passou uma Emenda Constitucional simples, mas poderosa:

Igualdade de Direitos, sob a Lei, jamais será negada ou limitada pelos Estados Unidos, ou por qualquer Estado, por base do sexo.

Uma frase que poderia, deveria, para sempre proibir a discriminação contra mulheres. Para ratificar uma emenda constitucional nos EUA, necessita-se aprovação por 38 dos 50 estados, e até 1979, data-limite, apenas 35 haviam ratificado. O Congresso Federal mobilizou-se e extendeu a data limite para 1982, e eis que a Igreja entra em ação, e mobilizando centenas (milhares?) de membros-voluntários e dezenas (centenas) de milhares de dólares para derrotar a emenda constitucional que proibiria a discriminação de mulheres. [14][15][16][17][18]

Durante as décadas de 1980 e 1990, a Igreja entrincheirou-se mais ainda contra o que ela (novamente, falamos da liderança masculina) percebia como “os males do avanço do mundo moderno” e a “desintegração da família”. Após enorme pressão, tanto externa como interna, a Igreja mudou na década de 1970 sua política sobre o uso de contraceptivos, e até alterou o desenho dos Garments sagrados para um corte mais “feminino”. Mas esta concessões apenas reforçam a intensidade quanto ao foco redobrado na insistência da não profissionalização das mulheres (com aumento nos temas “donas de casa” e “rainhas do lar”), na obsessão quase maníaca em “padrões” de vestuário e rídiculas regras sobre até quantos brincos se pode ter. [19][20][21][22]

A Igreja passou, então, a vigiar e excomungar acadêmicos que exploravam temas feministas e teológicos, em especial discussões sobre a Mãe Celestial, chegando um Apóstolo a enumerar Feministas como um dos três grandes adversários da Igreja. [23][24][25][26][27]

Desde sua fundação, a Igreja SUD é controlada e gerida por uma liderança exclusivamente masculina, diferentemente do movimento Cristão no primeiro século EC (i.e., “igreja primitiva”) que contava com Apóstolas e Diáconas e Profetisas. Até hoje, nenhuma mulher exerce função de liderança na Igreja, e as parsas posições administrativas (i.e., nas auxiliares) não gozam de independência gerencial ou financeira. [28][29][30]

Para o Futuro

Não obstante todos os problemas, há (discretos) sinais de melhoras. Há pouco mais de três décadas, mulheres voltaram a discursar em Conferências Gerais e a poder orar e discursar em reuniões sacramentais. Como mencionado acima, houve mudanças na liberação do uso de contraceptivos e no corte das roupas íntimas obrigatórias para mulheres. Talvez mais importantemente, em 1990 o ritual do Templo — sacramento máximo da Igreja SUD — foi alterado e o juramento de “ser submissa ao seu marido em todas as coisas” foi substituído por um juramento mais suave, brando, e menos imperial (embora ainda machista). [31][32][33]

Enquanto isso, o mundo avança também e, felizmente, mais rápido e mais progressista que a Igreja.

Outra igreja Mórmon, a Comunidade de Cristo, passou a ordenar mulheres ao Sacerdócio em 1984, contando com Apóstolas e até uma Conselheira na Primeira Presidência. [34]

Felizmente, campanhas mundiais demandando respeito a mulheres vem se proliferando no nosso mundo interconectado pela internet. No Canada, por exemplo, campanhas de conscientização contra estupro voltadas para homens, ao invés de focar no comportamento das mulheres, demonstra avanço no pensamento de que a responsabilidade repouso sobre o estuprador, e não a vítima! No Brasil, o movimento ainda é nascente, mas promete crescimento — e conscientização. Nos Estados Unidos, apesar da morte da Emenda Constitucional, a Lei Lilly Ledbetter assinada pelo Presidente Barack Obama (com oposição do mentiroso profissional candidato Mórmon Mitt Romney) proíbe discriminação financeira contra mulheres. No Brasil, lei similar é discutida no Congresso Nacional. [35][36][37][38][39]

De modo geral, a sociedade Ocidental caminha avante (a passos lentos) para maior igualdade entre os gêneros, e a Igreja também caminha (a passos muito mais lentos), embora sempre dependendo de pressão externa, e mais importantemente, interna. Nenhuma das mudanças mencionadas acima ocorreu sem forte persistência e pressão das mulheres SUD sobre os líderes homens, e talvez parte da letargia entre os homens venha da falta de pressão (interesse? foco? conhecimento?) por parte das mulheres Mórmons.

Vestindo Calças

A campanha ‘Vista Calças Para Sacramental’ já esta causando comoção e controvérsia, o que é excelente para iniciar-se um diálogo sobre um problema que, usualmente, passa desapercebido por muita gente, especialmente por homens. [40][41][42]

A campanha não é sobre que roupas mulheres podem vestir aos Domingos, mas sim sobre o fato de que essa decisão deve ser exclusividade delas, e de cada uma delas. A campanha também é sobre o quanto o corpo delas é de propriedade exclusiva delas, e de como nós homens pensamos nelas é de responsabilidade exclusiva nossa. E, finalmente, a campanha é sobre quão importante as mulheres são para a Igreja, e não apenas como mães e esposas, mas como suas opiniões, suas habilidades, e sua liderança podem e devem ser valorizadas — inclusive com Sacerdócio e lideranças (OK, essa última interpretação é minha, e não das organizadoras da campanha).

Homens também podem participar da campanha desse próximo Domingo:

… vestindo uma camisa, ou gratava, ou meias, ou mesmo um laço, na cor roxa, sendo roxo a cor históricamente associado com o movimento para o sufrágio [de mulheres].

Pessoalmente, eu recomendaria manter posições públicas clara a favor da ordenação da mulheres ao Sacerdócio e o fim da objetificação do corpo feminino, e afins, mas por enquanto, roupas roxas seriam um bom começo.

Gary Oldman, Feminista Mórmon?

Gary Oldman, Feminista Mórmon?

NOTAS E LINKS

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Mulheres

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MORMON-articleLargeA história mórmon é muitas vezes geralmente pela perspectiva de seus líderes. Ou seja, é um contar majoritariamente masculino.

Neste Dia Internacional da Mulher, quais mulheres você destacaria na história mórmon?


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Novidade na Conferência Geral

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Nos próximos dias 06 e 07 de abril, uma mulher poderá orar pela primeira vez numa  Conferência Geral

De acordo com o jornal Salt Lake Tribune, mulheres irão orar na próxima Conferência Geral sud. Pela primeira vez na história, até onde se tem registro. A Igreja não confirmou nem negou oficialmente a notícia.

Embora não haja nada na doutrina mórmon que justifique a excluir as mulheres de oferecer orações nas Conferências Gerais, essa tem sido a prática. Convém ressaltar que em 1978, durante a presidência de Spencer W. Kimball, a Igreja reverteu uma prática que perdurou durante parte do séc. XX: mulheres não podiam oferecer orações nas reuniões sacramentais!

Logo da campanha "Deixe as Mulheres Orarem"

Logo da campanha “Deixe as Mulheres Orarem”

É difícil não ligar a possível novidade de abril com a campanha Let Women Pray (“Deixe as Mulheres Orarem”), lançada nos EUA, e que conseguiu reunir mais de 1600 cartas, as quais foram enviadas para Autoridades Gerais, incluindo o apóstolo Jeffrey R. Holland e presidentes de organizações auxiliares. A campanha pedia a inclusão de mulheres nas orações da Conferência Geral, como um símbolo de igualdade dentro da Igreja.

Obviamente,é difícil determinar que influência direta a campanha teve sobre a hierarquia da Igreja ou há quanto tempo a mudança tem sido cogitada. Seja como for, caso haja uma mulher orando em uma sessão geral da Conferência, estará se quebrando uma pequena barreira – que talvez antes tenha passado até despercebida para muitos leitores -, mas de grande valor simbólico.


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Sacerdotisas

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(…) o homem que honra seu sacerdócio [his priesthood], a mulher que honra seu sacerdócio [her priesthood], receberão uma herança eterna no reino de Deus. (Brigham Young, Journal of Discourses 17:119)

Santos dos últimos dias estão acostumados a pensar o sacerdócio como sendo algo exclusivo para os homens. Muitas vezes até ouvimos a palavra “sacerdócio” para designar coletivamente os homens membros da Igreja sud. A citação acima de Brigham Young, porém, nos faz questionar nossa compreensão do que é o sacerdócio e de como ele pertence a homens e mulheres. E olha que Brigham não era exatamente um feminista.

O uso do sacerdócio por parte das mulheres é um dos temas mais fascinantes – e, mais do que nunca, atuais! – da história mórmon. As percepções que herdamos – ou “tradições dos homens”, literalmente – , porém, bloqueiam nosso entendimento; ou ainda, nos fazem ver o passado mórmon a partir das doutrinas e práticas da Igreja sud no presente.

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A promessa de Joseph Smith

Os ensinamentos do Profeta para a Sociedade de Socorro de Nauvoo eram de que homens e mulheres deveriam compartilhar do sacerdócio.Joseph Smith organizou a Sociedade Feminina de Socorro de forma bastante independente da hierarquia da Igreja – elas tinham suas finanças, sua própria liderança. Definitivamente, a Sociedade de Socorro não foi pensada para ser uma “organização auxiliar do sacerdócio”, mas uma organização do sacerdócio, composto por mulheres que portassem o sacerdócio. Joseph Smith utilizou uma inspiração maçônica para organizar tal sociedade e prometeu que lhes seriam dadas chaves do sacerdócio. Joseph Smith também aconselhou as mulheres a abençoarem os doentes e aflitos, com imposição de mãos.

Em abril de 1842, quando a Sociedade de Socorro foi organizada, Joseph Smith registrou o seguinte:

Às duas horas, reuni-me com os membros da ‘Sociedade Feminina de Socorro’ e após presidir na admissão de muitos novos membros, dei uma palestra sobre o Sacerdócio, mostrando como as irmãs viriam a possuir os privilégios, bênçãos e dons do Sacerdócio. (History of the Church 4:602)

Na terceira reunião da nova organização, ele ainda afirmou que “faria desta Sociedade um reino de sacerdotes como nos dias de Enoque”. ¹

Bênçãos com imposição de mãos

Com a aprovação de Joseph Smith, Emma – a presidente da Sociedade – e suas conselheiras, Sarah Cleveland e Elizabeth Whitney, administraram bênçãos com imposição de mãos. Na quinta reunião da Sociedade, certa irmã Durfee foi uma das pessoas que prestaram seu testemunho. Ela “prestou testemunho da grande bênção que ela recebeu na última reunião quando da administração por Emma Smith e Conselheiras Cleveland e Whitney”, acrescentando que “achava que as irmãs tinham mais fé do que os irmãos”. A prática de mulheres imporem as mãos sobre doentes persistiu durante todo o século XIX e início do XX.

Nosso preciosos preconceitos

Hoje, esses fatos do passado mórmon podem parecer estranhos ou até errados para muitas pessoas. Se pretendermos um estudo sério do assunto, teremos necessariamente que tentar abdicar de nosso preciosos preconceitos e tradições. E, obviamente, ir às fontes históricas.²

Resquícios

Independentemente da visão que hoje prevaleça na Igreja sud ou do número de homens que se sintam ameaçados e gritem “apostasia!”, de algumas mulheres sud que também se chocam com a ideia de serem portadoras do sacerdócio, os fatos históricos estão à disposição para nosso estudo.

No séc. XXI, sobreviveu um resquício dessa autoridade sacerdotal feminina no mais sagrado dos locais de adoração sud, o templo. Pensando nas ordenanças lá realizadas, gostaria de propôr as seguintes perguntas para a reflexão pessoal e o debate aqui neste blog:

- Por qual autoridade as mulheres ministram as ordenanças no templo?

- Se elas não possuem autoridade do sacerdócio, por que as ordenanças do templo não são administradas exclusivamente por homens?

- Aliás, se as mulheres não recebem o sacerdócio, por que recebem a investidura e usam as vestimentas do sacerdócio?

Fique à vontade para deixar seu comentário ou pergunta.

Notas

1. http://josephsmithpapers.org/paperSummary/nauvoo-relief-society-minute-book

2. Estarei explorando este e outros temas num curso presencial em Porto Alegre, intitulado Introdução à Doutrina de Nauvoo.


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A Sociedade de Socorro e o sacerdócio

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Emma Smith

Emma Smith

Em 1842, a organização da Sociedade Feminina de Socorro de Nauvoo fazia parte do complexo quebra-cabeças teológico e organizacional desenvolvido por Joseph Smith em seus últimos anos de vida. Muito mais do que uma sociedade dedicada à caridade, as atas da Sociedade de Socorro nos mostram que ela foi criada para ser uma organização sacerdotal que prepararia as mulheres para exercer dons espirituais e autoridade divina.

A recepção ou uso do sacerdócio por parte das mulheres é um dos temas mais interessantes da história mórmon. No entanto, além de ser pouco conhecido entre os membros da moderna Igreja sud, existem percepções que herdamos e que bloqueiam nosso entendimento; ou ainda, que nos fazem ler o passado com os lentes do presente.

A própria fundação da Sociedade de Socorro fornece importantes pistas da visão de Joseph Smith sobre o sacerdócio e sobre o papel que aquela organização feminina deveria ter. Em abril de 1842, quando a Sociedade de Socorro foi organizada, Joseph Smith registrou o seguinte:

Às duas horas, reuni-me com os membros da ‘Sociedade Feminina de Socorro’ e após presidir na admissão de muitos novos membros, dei uma palestra sobre o Sacerdócio, mostrando como as irmãs viriam a possuir os privilégios, bênçãos e dons do Sacerdócio.

Na terceira reunião da nova organização, ele ainda afirmou que

faria desta Sociedade um reino de sacerdotes como nos dias de Enoque.²

Com a aprovação de Joseph Smith, Emma – a presidente da Sociedade – e suas conselheiras, Sarah Cleveland and Elizabeth Whitney, administraram bênçãos com imposição de mãos.

"Casa de Tijolod Vermelhos", onde foi organizada a Sociedade de Socorro e administrada a investidura.

“Casa de Tijolos Vermelhos”, onde foi organizada a Sociedade de Socorro e administrada a investidura.

Na quinta reunião, a irmã Durfee foi uma das pessoas que prestaram seu testemunho. Segundo as atas da Sociedade de Socorro, ela “prestou testemunho da grande bênção que ela recebeu na última reunião quando da administração por Emma Smith e Conselheiras Cleveland e Whitney”, acrescentando que “achava que as irmãs tinham mais fé do que os irmãos”.

A prática de imposição de mãos por mulheres aparentemente não recebeu absoluta simpatia na Igreja, de forma que Joseph Smith reiterou sua propriedade. Na ocasião, ele enfatizou a cura como um fruto da fé e a autoridade recebida pelas mulheres da Sociedade para realizar a imposição de mãos:

não há nenhum mal nisso, se Deus deu sua aprovação pela cura (…) não há mais pecado em uma mulher impor as mãos do que umedecer o rosto [do doente] com água.³

A ideia da cura como resultante da fé, no entanto, não apaga a promessa feita de que os membros da Sociedade de Socorro receberiam o sacerdócio. A bênção patriarcal dada por Hyrum Smith a Leonora Cannon Taylor, em julho de 1843, fazia menção ao futuro recebimento do sacerdócio na investidura:

Serás abençoada com tua porção do sacerdócio que pertence a ti, para que sejas designada para tua Unção e tua investidura. 4

Note-se que a Sociedade de Socorro foi organizada oficialmente dois dias depois da iniciação de Joseph Smith na maçonaria. (Veja datas abaixo) Não seria exagero supor que a mesma motivação para seu ingresso na ordem maçônica estivesse também por trás de suas instruções às mulheres lideradas por Emma Smith: uma preparação para os rituais do templo.

Um mês antes da investidura ser administrada pela primeira vez a mulheres, Joseph Smith discursou sobre o Sacerdócio Patriarcal, uma ordem do sacerdócio cujo conhecimento seria revelado apenas no templo:

Vão e terminem o templo e Deus o encherá de poder e então receberão mais conhecimento a respeito desse sacerdócio.

A promessa, portanto, de que os santos receberiam mais conhecimento sobre o Sacerdócio Patriarcal foi feita a homens e mulheres. Ambos, igualmente, dependiam um do outro para ingressar no “novo e eterno convênio do casamento”, definido como uma “ordem do sacerdócio”.

A prática de mulheres imporem as mãos sobre doentes persistiu durante todo o século XIX e início do XX. Durante uma viagem à região da Palestina, o élder George A. Smith, membro da Primeira Presidência, estava com um grupo que incluia Lorenzo Snow, sua irmã Eliza e Feramorz Little. Em uma escala em Bolonha, Itália, sentiu-se mal. “Fiquei cansado e tonto”, escreveu em seu diário. George A. Smith então relata pedir a três indivíduos que ministrem um benção de saúde  - entre eles, Eliza R. Snow:

Entrei em um carro e voltei para o hotel. Ao chegar no hotel, encontrei-me tão indisposto que eu pedi aos Ir. Snow e Little e irmã Eliza para impôr as mãos sobre mim. 5

Boa parte das promessas feitas por Joseph Smith àquele grupo de mulheres – de que “viriam a possuir os privilégios, bênçãos e dons do Sacerdócio” – seria concretizada com as ordenanças do templo, a começar pela investidura. Nessa ordenança, chaves do sacerdócio eram transmitidas. Sobre a primeira vez em que Joseph Smith administrou a investidura a um grupo de oito homens, escreveu:

Dei-lhes instruções sobre os princípios e ordem do sacerdócio, cuidando dos lavamentos, unções, investiduras e da comunicação das chaves pertencentes ao Sacerdócio de Aarão, e assim sucessivamente até a ordem mais alta do Sacerdócio de Melquisedeque, explicando a ordem concernente ao Ancião de Dias (…). 6 [ênfase nossa]

Em setembro de 1843, a investidura foi administradas pela primeira vez a mulheres. Desde então, homens e mulheres recebem exatamente as mesmas ordenanças templárias, de forma que as mesmas chaves do sacerdócio são também transmitidas às mulheres. Com a organização da Sociedade de Socorro, Joseph Smith pretendia preparar as mulheres para a recepção do poder divino – o sacerdócio – e o uso de seus “privilégios, bênçãos e dons”.

Joseph Smith afirmou que “[t]odo sacerdócio é Melquisedeque; mas há diferentes porções ou graus dele”. [7] Tal fonte de poder divino, para os primeiros mórmons, transcendia e era independente de ofícios. Como explicado por Joseph F. Smith, quando presidente da Igreja, em 1903, “todos os ofícios na Igreja são simplesmente apêndices do Sacerdócio de Melquisedeque” (ênfase nossa). [8] Dessa forma, mesmo sem ordenações a ofícios específicos durante a investidura – ainda que recebendo nela a promessa dos ofícios de rainha e sacerdotisa -, era um conhecimento comum entre os santos dos últimos dias que mulheres, assim como os homens, eram investidas de autoridade do sacerdócio através das cerimônias do templo.

Cerimônias templárias em Nauvoo

1842

15/03 - iniciação de Joseph Smith na maçonaria

17/03 - organização da Sociedade de Socorro

04/05 - primeira administração da investidura a homens

1843

16 e 17/05 - instruções sobre casamento celestial e progênie eterna (D&C 131)

28/05 - selamento de Joseph e Emma Smith

12/07 - revelação sobre casamento celestial (D&C 132)

27/08 - discurso sobre três ordens do sacerdócio

28/09 - primeira administração da investidura a mulheres; Joseph e Emma Smith recebem “plenitude do sacerdócio”

Referências

1. History of the Church 4:602.

2. http://josephsmithpapers.org/paperSummary/nauvoo-relief-society-minute-book

3. Ata da Sociedade de Socorro, 28 de abril de 1842

4. Bênção patriarcal dada por Hyrum Smith a Leonora Taylor, 28 de julho de 1843, Departamento Histórico da Igreja; citado por Quinn, “Mormon women have had the priesthood since 1843”, p. 366-367.

5. George A. Smith, Diário, 09 de janeiro de 1873.

6. Ensinamentos do Profeta Joseph Smith, p. 231.

7. The Words of Joseph Smith, p. 59.

8. Conference Report, p. 87. Outubro de 1903. http://archive.org/stream/conferencereport1903sa/conferencereport742chur#page/86/mode/2up


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Prova dos Noves: Apóstolos e Profetas

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bibliaDécadas atrás, era comum no ensino da aritmética no ensino fundamental o uso de um truque matemático: A prova dos noves, ou mais popularmente, os noves-fora.

O truque consiste em somar os dígitos individuais de um número em uma operação aritmética simples (i.e., soma, subtração, multiplicação, e divisão), subtraindo 9 e adicionando os remanescentes dígitos. Compara-se, então, todos os números da operação com o resultado da operação, e caso coincidam, confirma-se o resultado.

Por si só, a prova dos noves não serve para resolver nenhum problema aritmético. Contudo, o seu valor reside em checar, ou confirmar, se o seu trabalho matemático (i.e., a sua conta) está correta. Hoje, com calculadoras em qualquer celular ou computador, ninguém mais sente a necessidade de um truque que, em outra época, já serviu a muita gente.

Não obstante, resulta-nos o legado da expressão “prova dos noves” ou “noves-fora” para qualquer ferramenta que cheque ou confirme a validade de uma idéia, ou hipótese, ou instinto, ou teoria. Serve também para uma ferramenta que teste a validade de uma ensinamento religioso, uma doutrina de fé, uma crença, ou qualquer escrito por apóstolos ou profetas.

Resta, então, a indagação: Existe uma “prova dos noves” para escritos de apóstolos ou ensinamentos de profetas?

Sim, existe.

Como a idéia me foi sugerida por um comentarista neste site, cita-lo-ei diretamente.

Em um artigo meu sobre a influência das decisões judiciais da Suprema Corte dos Estados Unidos sobre as políticas e ensinamentos da Igreja SUD (e especificamente, com relação à presente cruzada Mórmon anti-gay), um comentário me chamou a atenção por sua mediocridade intelectual:

Que tristeza… [v]er homossexuais ou simpatizantes tão inteligentes e conhecedores das ciências do mundo, das leis, filosofias, interações sociológicas e infelizmente tão leigos a respeito dos mandamentos e leis de Deus.

Apesar de me sentir envaidecido com o elogio (“inteligente e conhecedor das ciências”? Quem me dera!), eu respondi ilustrando a ignorância fundamental e o erro de raciocínio desta construção (i)lógica:

…tais “mandamentos e leis” foram, todos e sem exceção, frutos diretos e indiretos dos contextos históricos e dos preconceitos dos homens que os ditaram ou escreveram. Dentre esses “mandamentos e leis de Deus” estão ordens para assassinar mulheres e crianças, permitir o estupro de mulheres virgens, permitir a escravidão de outros seres humanos, coagir mulheres a serem esposas plurais e concubinas, coagir adolescentes a se casarem secretamente com profetas, proibir dessegregação racial de espaços e ordenanças sagradas, etc. Estes “mandamentos e leis de Deus” vem mudando com o passar do tempo e da história, com a tendência de evoluir de posições mais preconceituosas e menos éticas para posições menos preconceituosas e mais éticas.

E este é fato histórico inegável. Apenas pessoas completamente ignorantes da história de sua própria fé (ou apologistas simplesmente desonestas) não compreendem que não há “lei” ou “mandamento” que não tenha mudado ou evoluído com o passar do tempo, da aquisição de conhecimentos científicos, ou da evolução intelectual e moral da sociedade autóctone.

Quantos Cristãos se sentiriam a vontade com mandamentos divinos que demandem a matança indiscriminada de mulheres e crianças de outras religiões? Ou a escravidão de mulheres virgens para coerção sexual/matrimonial? Ou que obriguem uma mulher vítima de estupro a casar-se com seu estuprador? Ou que exijam que escravos sejam submissos a seus mestres Cristãos? Ou que permitam a escravidão humana em geral? Ou que permitem que não-Cristãos sejam torturados durante 5 meses sem mata-los por sua descrença? Ou que proibam mulheres de falar em público, ou de chefiar ou liderar homens em quaisquer capacidades? Ou que obriguem mulheres a serem completamente submissas e obedientes a seus maridos, mesmo aos que sequer sejam bons Cristãos?

Eu imagino (ou melhor, espero) que nenhum. Cristãos, em seu maioria, sabem (consciente ou instintivamente) que tais “leis” ou “mandamentos” não se aplicam mais a eles, apesar de suas posições no cânone oficial, pois o universo Cristão tem mudado e evoluído com o passar do tempo, da aquisição de conhecimentos científicos, e da evolução intelectual e moral da sociedade Cristã e não-Cristã.

Esse conhecimento assusta os fiéis, especialmente aqueles com maiores limitações intelectuais (i.e., os que não conseguem enxergar o mundo ou a realidade além do simplista preto-e-branco, nós-contra-eles) ou com maiores benefícios sociais (i.e., os que derivam status social elevado devido à sua religiosidade). Por que? Porque isso significa que qualquer “lei” ou “mandamento” na atualidade pode ser submetido ao escrutínio do julgamento de gerações futuras mais iluminadas que a nossa, e julgados como imorais ou anti-éticos, ou simplesmente como simplistas ou supersticiosos.

Sendo isso a (óbvia) verdade, a questão que se forma na cabeça de todo fiel pensante e preocupado é: Como saberei quais “leis” e “mandamentos” são “eternos” e relevantes e quais são frutos dos preconceitos e da ignorância humana dentro do meu próprio contexto sócio-cultural? Em outras palavras, qual seria a proverbial “prova dos noves”? Qual seria os “noves-fora” para determinarmos qual “lei” ou “mandamento”, qual escrita apostólica ou discurso profético merece consideração absoluta? E, consequentemente, qual poderíamos simplesmente relegar ao nosso próprio julgamento ético ou crítico, confiando na sabedoria das possíveis gerações futuras?

Eis como respondeu, à minha réplica, este nosso comentarista assíduo:

Concordo em parte com você, pois sou um homem de fé e creio que Deus sempre se comunicou com os profetas bíblicos, do livro de Mórmon e modernos. Mas, infelizmente, os contextos históricos e preconceitos os fizeram, muitas vezes, agir mais de acordo com seus pensamentos, achando assim que estavam fazendo a vontade de Deus. Um dos mandamentos principais de Deus, o amor ao próximo, não foi muito seguido no antigo testamento e poucos o fazem hoje. Jesus mandou amar até o inimigo, e porque muitos cristãos hoje odeiam os homossexuais? Eles apenas tem uma orientação diferente, mas são humanos. Nenhum cristão é obrigado a ser a favor da união homoafetiva, mas porque tanto ódio? Os mandamentos de Deus são puros e verdadeiros, o ser humano é quem os deturpa.

E aí está, sucinta e profundamente elaborada, a “prova dos noves”. Se o que o Apóstolo ou o Profeta escreveu ou está dizendo incita-nos a tratar as outras pessoas — além de nós mesmos, além de nossos familiares, além de nossos amigos próximos, além de nossos colegas, além de nossos correligionários — com respeito, com dignidade, com humanidade, ou mesmo com amor, então trata-se de um ensinamento, uma lei, ou um mandamento válido.

O contrário também é verdade. Se o que o Apóstolo ou o Profeta escreveu ou está dizendo incita-nos a tratar as outras pessoas com desrespeito, com indignidade, sem humanidade, com preconceito, ou mesmo com ódio, então trata-se de um ensinamento, uma lei, ou um mandamento inválido, e/ou que provavelmente será invalidado no julgamento de gerações posteriores.

Poligamia é um exemplo claro disso. Quantas pessoas, na Igreja SUD, defendem poligamia como uma boa idéia hoje? Quantas pessoas não inventam desculpas, ou mesmo mentiras, para tentar aliviar a poligamia do passado? Racismo é outro excelente exemplo disso. Quantas pessoas hoje acreditam que segregação racial é idéia boa, ética, ou moral? Mas até 1978, os Profetas e Apóstolos (e os membros) da Igreja SUD achavam perfeitamente defensível. Quem defenderia mudar a política atual para retomar a segregação racial?

A questão com os homossexuais é um dos temas atuais. Será discrimina-los uma postura ética, ou moral, ou mesmo digna? Expulsa-los da Igreja por se casarem ou constituírem famílias, com filhos, é mostrar compaixão e trata-los com dignidade? Gastar centenas de milhões de dólares para evitar que haja leis que os protejam, mesmo os gays que sequer Mórmons sejam, é uma atitude que daria orgulho a Jesus? Que ensinou “amai-vos uns aos outros” ou “..até os inimigos”?

A questão da mulheres é um outro tema atual. Será discrimina-las, negando oportunidades eclesiásticas, profissionais, ou mesmo pessoais uma postura ética, ou moral, ou digna? O que dirão os nossos netos ou bisnetos ao descobrirem que na nossa geração, a Igreja SUD não permitia que mulheres fossem líderes ou ordenadas, e incentiva-as a não terem carreiras profissionais ou que suas vestimentas ou a limpeza de suas casas são importantes indicadores espirituais. Gastar milhões de dólares para evitar que haja leis que as protejam, mesmo as mulheres que sequer Mórmons sejam, é uma atitude que daria orgulho a Jesus? Que ensinou “amai-vos uns aos outros” ou “..até os inimigos”?

No frigir dos ovos, tudo se resume em amor, tolerância, respeito, e dignidade ao próximo. Tratar o outro como desejamos que nos tratem os outros. Afinal, não é isso a essência do que é (ou deveria) ser Cristão?

_________________

Para quem está realmente curioso, e não aprendeu os noves-fora na escola, e ainda ficou inteiramente insatisfeito com o meu simples resumo acima, eis um exemplo prático:

Imagine a seguinte conta:

Página 3

Existem duas maneiras de se aplicar a prova dos nove, ambas se equivalem:

No primeiro número 3562 somam-se os algarismos e cada vez que a soma superar o nove, tira-se este mesmo nove logo:

3 + 5 = 8 + 6 = 14 menos 9 = 5, continuando 5 + 2 = 7.

A outra maneira parece ser melhor, somam-se todos os algarismos:

3 + 5 + 6 + 2=16 -> 1 + 6 = 7.

Lembre que , se o valor der nove, ao diminuirmos o nove teremos zero, o famoso “noves fora, nada”.

Logo a prova dos nove do primeiro número é 7.

Página 3

Deve-se fazer o mesmo processo para os outros termos e verificar a soma dos termos da prova dos nove:

Página 3

Nota-se que a conta está correta, pois a soma dos termos da prova dos nove e dos termos do resultado dá o mesmo valor.

A prova dos nove para a multiplicação
Usa-se o mesmo procedimento, veja:

Página 3

Logo:

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Por que Rapazes Fazem Missão e Moças Fazem Bolo?

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Texto de Larissa Arce Centurião

Sobre a separação de tarefas por gênero dentro da igreja

Foto: littlemisskaelin.tumblr.com.

Foto: littlemisskaelin.tumblr.com.

Comecei a prestar mais atenção em certos ensinamentos na igreja para compreender por que me prometiam a felicidade mas estavam, de um certo modo, se tornando um incômodo. De princípio até acreditei que meus questionamentos eram desnecessários e que a necessidade de mudança devia estar fora de cogitação. Afinal, quem é que nunca escutou a velha frase: ‘A Igreja é perfeita’?

Porém tomei conhecimento de que o problema estava em algumas doutrinas repletas de sexismo, e isso definitivamente não é saudável para o crescimento de mulheres na igreja (digo mulheres pois são as mais prejudicadas, mas os homens não fogem das consequências). Principalmente para que tenham a plena noção de que os estereótipos extremos na sociedade não fazem nenhum bem, tornando assim o evangelho duvidoso.

Acredito que a base para esses ensinamentos esteja nas organizações dos jovens (ORM). Quando uma criança completa doze anos de idade, ela desvincula-se da primária e passa a ter aulas separadas e especificas de acordo com o seu sexo.

Jovem posando com a publicação "Progresso Pessoal". Foto: lds.org

Jovem posando com a publicação “Progresso Pessoal”. Foto: lds.org

Essas aulas dão ênfase para os jovens de seu verdadeiro papel na terra, e eu como Laurel aprendi nesses quatros anos meu verdadeiro papel como mulher e claro minhas responsabilidades diante da família. Creio que os irmãos já imaginam quais ensinamentos tive nesses quatro anos, pois nas organizações dos adultos não é diferente, a questão é que para os jovens passa-se uma visão ‘natural’ das coisas, ensinando toda a visível divisão de tarefas de modo sútil durante tais aulas.

Aprendi que sou uma moça, naturalmente mais frágil, possuo uma afinidade maior e uma responsabilidade maior com os afazeres domésticos, devo ter filhos (sem mas), a responsabilidade de cuidar deles é minha, devo cuidar e ajudar meu futuro esposo com o sacerdócio, e de um modo aprendi também o papel do homem: ele é o cabeça, tem a responsabilidade de me sustentar e o direito de tomar as decisões finais da família.

Com essa explicação objetiva dos ensinamentos devo assustar alguns, mas a prova que tenho de que o que falo é verídico é muito simples, os manuais com metas para obter um testemunho pessoal de Jesus Cristo – diferentes para meninas e meninos.

Imagem da publicação "Dever Para Com Deus".

Imagem da publicação “Dever Para Com Deus”.

Ao analisar Dever para com Deus (dos Rapazes) e Progresso Pessoal  (das Moças) é óbvia a separação de tarefas por gênero. Observamos o foco para os rapazes fazerem o trabalho missionário, adquirir conhecimento e habilidades para um futuro emprego.  Já o Progresso Pessoal das Moças foca na “natureza divina da mulher”, aconselhando sobre o natural instinto materno, com metas para ajudar a família em afazeres domésticos, aprender a cozinhar, costurar, e ainda possui uma opção no projeto de boas obras de “ser uma boa dona-de-casa”.

“Ah! Mas no dever para com Deus também possui meta para os rapazes cumprirem atividades no lar” “Ah! Mas no Progresso Pessoal existe meta de obra missionária”. Ok irmãos, gosto de falar em números, alguém ai já comparou?

O sistema de metas dos dois livrinhos é completamente diferente. Até mesmo entre os jovens é reconhecido que o Progresso Pessoal das Moças é mais difícil, pois depende de um tempo e um foco maiores, moldado aos seus oito valores (fé, natureza divina, valor individual, conhecimento, escolhas e responsabilidades, boas obras, integridade e virtude – Princípios básicos para uma boa moça Sud). A Organização dos Rapazes não possui tais valores como foco, nem se comenta esses valores especificamente. Por que não focar em virtude com os Rapazes assim como nas Moças? 

Repetidas vezes no Dever para com Deus é possível ver imagens de missionários, e apenas duas imagens de meninos lavando a louça (páginas 26 e 75), exemplos dados para as metas de servir ao próximo (qualquer próximo), diferentemente do Progresso Pessoal das Moças, em que todas as atividades referentes ao lar são claramente colocadas para nos preparar a uma futura responsabilidade dentro da família: “O serviço é um princípio essencial da vida familiar. Por duas semanas, ajude a preparar o cardápio de sua família, consiga alimentos e prepare parte das refeições” (Boas Obras, p. 54).

Quando comentado no começo do texto de que os homens não fugiam de tais consequências não houve nenhuma ideia precipitada, afinal, a maneira como eles são ensinados e cobrados da responsabilidade masculina de sustentar toda a família e tomar sobre si todos os problemas fora da responsabilidade materna (filhos, limpeza), e a obrigação (sim, obrigação) de cumprir uma missão de tempo integral também é de se preocupar.

“Se você tiver uma renda, desenvolva e siga um planejamento pessoal de despesas e de poupança. Inclua o pagamento do dízimo e uma poupança para a missão.” Pg.57

Foto: lds.org

Foto: lds.org

Muitos irão criticar o que escrevo, dizendo que é impossível questionar algo que veio da inspiração do Senhor, mas digo: sim, acredito que um manual para os jovens poderem facilmente adquirir um testemunho de Jesus Cristo deve existir, acredito que ensinar sobre a importância do trabalho missionário e a importância de servir também é necessário, acredito que ensinar afazeres domésticos para a proximidade da independência e a importância do aprendizado para os cuidados de uma criança também é extremamente importante, porém, quando ensinado igualmente para os dois.

As pessoas gostam também de lutar contra este argumento apresentando o famoso testemunho dos apóstolos “A Família: Proclamação ao Mundo”: ‘Segundo o modelo divino, o pai deve presidir a família com amor e retidão, tendo a responsabilidade de atender às necessidades de seus familiares e de protegê-los. A responsabilidade primordial da mãe é cuidar dos filhos.’

Não existe documento mais contraditório e patriarcal. Esse documento foi feito por homens. Existe sim um equívoco. Deve haver a necessidade de todos compreenderem a importância da família, porém, não dessa forma.

Infelizmente acho triste mulheres se fecharem a essas ideias, ou então, procurar igualdade ‘até onde convém’. Nós podemos ser mais do que nos apresentam que podemos ser.

Eu não estou querendo dizer que todas as mulheres devem abolir o pensamento de responsabilidade dentro do lar, mas sim, que TODAS devem ter a noção de que sua escolha e sua liberdade não se limitam a isso, todas devem ter a visão de que estar ali é uma escolha e não uma obrigação.

Foto: lds.org.

Foto: lds.org.

Acredito que devem e vão haver algumas mudanças. Uma prova é o direito de sisters  ocuparem cargos na missão antes negados. Ainda falta muito, mas já seria excelente se os membros começassem a compreender e a se sentirem livres para argumentar e questionar certas doutrinas da igreja.

Sei que os problemas apresentados estão presentes nos moldes da sociedade, mas se este é o evangelho de Cristo deve-se então desprender-se dessas ideias e procurar o melhor para seus membros. Todos sofremos as consequências do patriarcado, e o ensinamento igualitário atrai benefícios em qualquer situação.

*Sobre a autora:

Larissa Arce Centurião tem 16 anos e acaba de ingressar no Curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.


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Ordenação às Mulheres

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mulheresCresce, aos poucos, na Igreja SUD uma conscientização coletiva de que mulheres SUD não vêm sendo tratadas ou consideradas com a mesma igualdade de respeito e oportunidade que os homens SUD. Tais reflexões não são novas ou originais, mas o que mais impressiona no presente momento é a penetração social desta ideia. Além de uma crescente mobilização entre mulheres SUD, parece haver uma recíproca preocupação entre a liderança (exclusivamente masculina) SUD.

Não obstante o progresso visto nos últimos anos, há mulheres na Igreja que finalmente estão reinvindicando equalidade total através de um (gigante) passo simbólico: ordenação de mulheres ao Sacerdócio.

Antecedentes

A proposição não é inédita. Na igreja Cristã no primeiro século E.C. era comum ver mulheres em posições de liderança eclesiástica. Junias, esposa de Andrônico, servia como Apóstola. Phoebe servia como Diácona na cidade de Cenchreae. Priscila, esposa de Áquila, era Missionária (συνεργός) com os demais Apóstolos e líder da uma congregação (o equivalente a “presidente de ramo”) na “Ásia” (Turquia). Entre outras mulheres que igualmente serviam como líderes de congregações estavam LídiaEvódia, Síntique, Ninfas, Cloé, e as 4 filhas de Felipe.

Mesmo na tradição Mórmon, há exemplos de ordenação de mulheres. Quando Joseph Smith decidiu incorporar a já organizada (independentemente por um grupo de mulheres) Sociedade de Socorro sob a direção da Igreja, prometeu que iria conferir “poder e autoridade e as chaves do Sacerdócio” à organização de mulheres. Infelizmente, essa abertura foi abortada quando Emma Smith tentou usar a Sociedade de Socorro para coibir os casamentos plurais secretos de Smith e a Sociedade foi desorganizada, até que Brigham Young a reorganizou anos depois. Sob a direção de Eliza Snow, uma das esposas plurais de Young, a organização de mulheres passou a gozar novamente de maiores liberdades, exercendo o seu Sacerdócio para curar, profetizar e realizar outras ordenanças, além de incentivar estudos e carreiras (e até o sufrágio) para mulheres. Infelizmente, essa abertura também foi abortada na virada do século XIX para o XX em concomitância com o fim gradual da poligamia e uma transição de um modelo patriarcal aberto (i.e., poligamia) para um mais velado (i.e., submissividade feminina). O uso do Sacerdócio feminino foi “desencorajado” e a Sociedade de Socorro perdeu sua independência financeira e editorial.

Outra igreja Mórmon, contudo, optou por encerrar esta forma de discriminação baseada em gênero e canonizou na Doutrina e Convênios uma revelação recebida em 1984 pelo bisneto de Joseph Smith, Wallace B. Smith. Desde 1985, mulheres na Comunidade de Cristo são ordenadas ao Sacerdócio normalmente, servindo em diversas posições de liderança, inclusive no Conselho dos Doze Apóstolos e na Primeira Presidência.

Com uma rica tradição de inclusividade às mulheres, tanto nos primórdios Cristãos, como na própria história Mórmon, por que a Igreja SUD insiste em segregar as mulheres para uma condição de status secundário? Esta é uma das perguntas levantadas por muitas mulheres SUD.

Atualidade

Dois artigos recentes no The New York Times descrevem tanto as mudanças recentes dentro da Igreja SUD como a militância de mulheres SUD para serem incluídas dentro da Igreja como “iguais”.

Nos útimos 18 meses, a Igreja reduziu a discrepância de idades entre homens e mulheres para serviço missionário (de 19 e 21 anos, respectivamente, para 18 e 19 anos) e passou a autorizar alguns cargos de lideranças para mulheres missionárias. Além disso, um membro da Primeira Presidência chegou a admitir que a Igreja havia errado no passado justamente enquanto mulheres SUD do movimento ‘Ordain Women’ (n.t., Ordene as Mulheres) tentavam entrar na Reunião do Sacerdócio da Conferência Geral (e protestavam sua exclusão).

Estes passos podem ser vistos como progresso inquestionável. Há duas décadas a Igreja caçava e excomungava mulheres que publicavam artigos acadêmicos sobre Mãe Celestial ou ordenação às mulheres. Hoje protestam e abrem petições online sem serem perseguidas. Há duas décadas, mulheres eram permitidas como missionárias, mas não encorajadas. Hoje são incentivadas a servirem, mais jovens até. Há duas décadas, mulheres eram incentivadas pelo Presidente da Igreja a não trabalharem e não terem carreiras e a serem donas-de-casa integralmente. Oras, há um ano uma mulher até ofereceu uma oração em plena Conferência Geral. A primeira em quase 200 anos. Pasmem! Certamente, houve muito progresso.

Mas não é suficiente ainda, dizem as irmãs da Igreja.

Estas destemidas irmãs da Igreja acreditam que ainda há muito sexismo na abordagem da educação sexual e moral das crianças e adolescentes SUD. Elas se opõe publicamente a uma Autoridade Geral que sobe ao púlpito em Conferência Geral para exortar as mulheres SUD a encontrarem seus propósitos de vida em serviços domésticos. Milhares delas, inclusive, solicitam medidas específicas e práticas às Autoridades Gerais para mitigarem a discrepância no tratamento entre mulheres e homens, como permitir que mulheres abençoem seus filhos, sirvam de testemunhas em ordenanças, possam se selar a seus segundos maridos (após divórcios ou viuvez), ou sejam incluídas nos conselhos de liderança em estacas e nos conselhos gerais.

No frigir dos ovos, tudo repousa na questão de tratar mulheres de maneira egalitária aos homens. Ordenando mulheres ao Sacerdócio, abrem-se as portas para que sirvam em posições de liderança administrativa e institucional. Com as perspectivas femininas sendo levadas em consideração em pé de igualdade com as perspectivas masculinas (que, atualmente, são as únicas), todos os dilemas e desafios vivenciados (e ignorados) por mulheres SUD poderão ser estudadas e consideradas com pertinência e relevância. As mulheres Apóstolas, as mulheres Setenta, as mulheres Bispas e Presidentes de Estaca terão conhecimento pessoal das entrevistas inapropriadas ou do foco exagerado e distorcido em vestimentas, e poderão levantar estas questões nos comitês relevantes. Ademais, a simples visão de mulheres no púlpito, ao leme, e em comando traria às crianças e meninas e adolescentes SUD lições incalculáveis sobre auto-estima feminina, a importância das mulheres na sociedade e na Igreja, e de tratar todas as pessoas, independente de gênero, como iguais perante Deus e os seres humanos.

Experiência Pessoal

Crescendo na Igreja, portando um pênis na Primária e o Sacerdócio na adolescência, eu nunca tinha me dado conta que houvesse diferenças no tratamento entre mulheres e homens. Como membro da classe privilegiada, eu simplesmente achava “natural” que houvesse tais diferenças e ignorava as (poucas) vozes que sugeriam o contrário.

Ela não pode ser considerada menos missionária do que qualquer menino de gravata!

Ela não pode ser considerada menos missionária do que qualquer menino de gravata!

Até a minha missão. Como missionário, eu tive a primeira experiência que me fez realmente considerar a posição feminina.

Na época eu estava servindo como líder de zona, e como tal, era responsável por todos os missionários no meu país. Com a distância da ca

sa da missão, a mim ficava delegado as decisões de autorizações de viagens. Uma das missionárias, Jenny Bartholomew, me ligou no Domingo à noite para passar as estatísticas da semana em sua cidade e aproveitou para me pedir permissão para uma viagem no seu dia de folga.

Eu respondi:

– Ok. Você acha que vocês conseguem voltar antes do anoitecer?

– Eu acho que sim. Mas pode ser que não consigamos.

– Certo. Eu me sentiria mais confortável se vocês fossem com os missionários, então.

– O QUÊ???

– Eu disse que eu me sentiria mais confortável se vocês fossem com os OUTROS missionários. Para segurança.

– Ah, tá! Eu vou falar com eles, então.

Eu adorava a Sister Bartholomew. Ela era muito esforçada, muito trabalhadora, muito mais inteligente que quase todos nós, e certamente a mais adulta da missão (e isso incluindo o Presidente da Missão e esposa). Algumas semanas antes, eu estava visitando a cidade delas, e ela me havia dito que se incomodava como os missionários (homens) tratavam as missionárias como “menos” missionários do que eles. Eu retruquei que achava isso um absurdo, que elas eram idênticas aos outros missionários, e que isso era apenas uma percepção exagerada dela. E ela deixou a conversa por ali.

Eu tenho certeza de que ela se lembrou daquela conversa quando eu cometi o meu ato-falho. Eu estava sendo perfeitamente sincero quando lhe havia dito que as considerava iguais — certamente, eu a considerava mais, pessoalmente, que qualquer outro missionário. Não obstante, eu devo ter ouvido essa distinção tantas vezes, por tantas pessoas (e, infelizmente, pelo Presidente de Missão), que ela se espreitou às minhas palavras de maneira inconsciente e inesperada.

“Eu me sentiria mais confortável se vocês fossem com os missionários.” Como se elas não fossem missionárias! Eu fiquei mortificado. Por semanas, morria de vergonha ao falar com ela, que, graciosamente, jamais tocou no assunto novamente. Contudo, jamais deixou de tocar a minha consciência.

Eu percebi, então, que mulheres na Igreja (e, infelizmente, não apenas na Igreja) passam por desafios que eu, como homem, não consigo nem enxergar direito simplesmente por não vivencia-los. Nós, homens, podemos tentar entender o que vivem as mulheres, mas nunca conseguiremos compreender adequadamente. Por isso, elas merecem ter a voz e a autoridade e o poder para expressar os seus anseios, os seus sonhos, os seus medos, e os seus desafios. E isso nunca ocorrerá enquanto houver homens que acreditam que podem falar (e legislar e profetizar) em seus lugares.

Conclusão

A estrutura social Mórmon em tôrno da Igreja SUD permanece fundamentalmente patriarcal e machista. Acreditar que é um problema que não nos compete solucionar, e que qualquer solução deve vir “de cima pra baixo” é uma postura imoral e preguiçosa. Acreditar que, por ser um problema prevalente em toda a sociedade autóctone seja aceitável que o seja dentro do Mormonismo é ofensivo à própria idéia de que a Igreja deva servir de liderança moral e ética ao Mundo. Parabéns às mulheres que tem a coragem moral de tentar mudar o mundo, e a fé, para que as inclua e as trate dignamente. A nós, homens, nos resta apenas apoiar estas mulheres de coragem.

 

Feminista?

 


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Novo Presidente para BYU Anunciado

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BYU LogoO Presidente Henry Eyring, primeiro conselheiro da Primeira Presidência, anunciou hoje o nome do novo, e décimo-terceiro, presidente da BYU.

O prestigioso cargo será de Kevin J. Worthen, ex-reitor da faculdade de direito da BYU e um dos atuais vice-presidentes da BYU.

Apesar de ainda não sermos agraciados com uma presidente mulher para a “Universidade do Senhor”, somos informados que o comitê de buscas sob a direção do Board (este consistindo no “Presidente da Igreja”, “algumas autoridades gerais”, alguns “líderes da comunidade”, e “descendentes de Brigham Young”) da BYU incluiu nomes de mulheres entre as candidatas potenciais.

Históricamente, todos os presidentes da Universidade de Brigham Young foram homens SUD, muitos deles eram ou tornaram-se Autoridades Gerais da Igreja.

Warren N. Dusenberry (1876)

Karl G. Maeser (1876-1892)

Benjamin Cluff (1892-1903)

George H. Brimhall (1904-1921)

Franklin S. Harris (1921-1945)

Howard S. McDonald (1945-1949)

Ernest L. Wilkinson (1951-1971)

Dallin H. Oaks (1971-1980)

Jeffrey R. Holland (1980-1989)

Rex E. Lee (1989-1995)

Merrill J. Bateman (1996-2003)

Cecil O. Samuelson (2003-2014)


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Jane Manning James – parte I

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jane3A história de Jane Elizabeth Manning James (1822-1905) tem se tornado cada vez mais conhecida por um número crescentes de mórmons e estudiosos do mormonismo. Uma história que inclui fome e perseguição; seu abandono pelo marido durante longas duas décadas; sua insistência junto a um presidente da Igreja para receber certas ordenanças; sua convivência no lar de Joseph e Emma Smith, e muitos outros acontecimentos que tornam sua vida como mulher mórmon e negra uma narrativa única e impressionante.

Na nova página publicada pela Igreja sud em dezembro do ano passado, acerca das visões raciais no mormonismo, o nome de Jane é citado da seguinte forma:

Jane Manning James, membro fiel negra que atravessou as planícies e viveu em Salt Lake City até sua morte, em 1908, (…) pediu para entrar no templo, foi autorizada a realizar batismos por seus antepassados mortos, mas não foi autorizada a participar de outras ordenanças.

Ela também foi um dos personagens retratados no filme Joseph Smith: o Profeta da Restauração,  produzido pela Igreja sud em 2005, em que a jovem de 21 anos, recém chegada a Nauvoo, virou uma mulher de 45-50 anos.

Jane Elizabeth Manning nasceu em 1822, em Wilton, no estado do Connecticut. Era uma negra livre e desde menina trabalhou numa fazenda. Seu encontro com missionários mórmons na sua cidade natal, em 1843, fez com que ela não só se convertesse, mas também liderasse oito pessoas de sua família na migração para Nauvoo, incluindo seu filho pequeno e sua mãe. A família de Jane foi impedida de seguir com o grupo maior de conversos quando lhes foi negado entrar num barco no estado de Nova York, sendo então obrigados a seguir a pé.

Em sua autobiografia, Jane relembra:

Caminhamos até nossos sapatos gastarem e nossos pés ficarem doloridos e rachados e sangrarem até se ver toda a marca dos nossos pés com sangue no chão. Paramos e nos unimos em oração ao Senhor, pedimos a Deus, o Pai Eterno, para curar nossos pés e nossas orações foram respondidas e nossos pés curados sem demora.

No filme produzido pela Igreja em 2005, Jane chega com os pés sangrando e Joseph Smith lhe aplica bandagens, uma licença poética que ironicamente nega seu relato de cura divina (trecho entre 52:30 e 53 minutos).

Ao longo de mais de 1287 quilômetros, Jane e sua família tinham que dormir muitas vezes a céu aberto. Mas a dureza não estava apenas na natureza.  Ao chegarem a Peoria, no estado de Illinois, os Manning sofreram ainda a ameaça de serem presos, por não portarem documentos que atestassem sua alforria – o que lhes causou grande aflição uma vez que nenhum deles jamais havia sido escravo.

Seguimos nosso caminho nos alegrando, cantando hinos e agradecendo a Deus por sua infinita bondade e misericórdia para nós (…)

Quando finalmente chegam a Nauvoo, os nove santos negros são guiados até a casa de Joseph Smith. Em suas memórias, Jane disse ter reconhecido o rosto do profeta de um sonho que tivera. Eles são apresentados então a Emma e Joseph Smith e se sentam junto a outros convidados. Joseph pede a Jane que relate a sua história. A família Manning então ouve de Joseph Smith “Deus os abençoe. Vocês estão entre amigos. Agora serão protegidos”.

Depois de uma semana na casa dos Smith, todos acham novas casas e trabalho, com exceção de Jane. Chorando uma manhã, ela é vista por Joseph Smith. Jane relata o diálogo entre os dois. “Todo mundo foi embora e achou uma casa e eu não tenho nenhuma”. Ao que Joseph respondeu

Sim, tem. Você tem uma casa aqui mesmo se quiser. Não deve chorar. Nós secamos todas as lágrimas aqui.

"Mansion House", onde Jane viveu com a família Smith.

“Mansion House”, onde Jane viveu com a família Smith.

Durante os meses que viveu na casa, ajudando no trabalho doméstico, Jane conversava seguidamente com a mãe do profeta, Lucy Mack Smith, e tinha também a companhia de outras jovens que lá moravam, esposas plurais de Joseph, como Eliza e Emily Partridge e Sarah e Maria Lawrence.

Não se sabe quando ou como Jane tomou conhecimento das doutrinas e práticas que estavam em desenvolvimento em Nauvoo, ou qual foi sua reação inicial ao casamento plural. Mas seria possível que nas tarefas domésticas Jane tivesse visto as “roupas do santo sacerdócio” ou detectado no convívio social as relações românticas entre Joseph Smith e outras mulheres. O fato é que a experiência no lar Smith lhe foi marcante por toda a vida e decisiva na sua devoção por Joseph Smith.

Em suas memórias, ela definiu Joseph Smith como “o melhor homem que já vi na terra” e “um homem bom, grande, nobre e belo”. Quando soube do seu assassinato, Jane disse que sentiu o desejo dela própria morrer.

Após migrar para as Montanhas Rochosas, Jane pediria à Primeira Presidência para poder ingressar no templo, batizar-se por seus ancestrais, ser selada a um marido e ainda, em um dos momentos mais duros de sua vida, ser selada como filha a Joseph Smith, no novo e eterno convênio. Sua luta nesse período será tratada na segunda parte deste post.


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Reação Contra Mulheres

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medalhaoCelebrando o Dia Internacional das Mulheres com uma ‘Semana das Mulheres Mórmons‘ aqui no Vozes Mórmons, recebemos algumas reações que são ilustrativas e representativas, que valem ser exploradas e analisadas.

A própria Igreja SUD reagiu com uma nota oficial (endereçada ao movimento de mulheres SUD conhecido como ‘Ordene às Mulheres’, representado aqui no Vozes Mórmons pela articulada Kristy Money). Esta reação merece ser explorada e analisada.

A triste realidade é que a cultura Mórmon (dentro do contexto SUD) persiste embuído de um profundo senso de preconceito contra mulheres. Expressões populares como sexismo, machismo, e misoginia descrevem aspectos do que, na realidade, é nada mais que um preconceito enraízado na consciência coletiva Mórmon.

Definindo Têrmos

O sociologista francês Émile Durkheim introduziu a noção de “consciência coletiva” como o conjunto de ideias, atitudes morais, e crenças que funcionam como força unificadora dentro de sociedades específicas. O compartilhamento de ideias, crenças, e morais forja uma identidade coletiva que doutra maneira jamais existiria além do individualismo primário.

Mórmons, como quaisquer outros grupos, derivam seu senso de identidade enquanto grupo (social, religioso, etc.) deste conjunto de noções básicas compartilhadas. Dentre estas noções está a crença de que mulheres são inferiores e subservientes aos homens. Esta noção coletiva está fundamentada em preconceitos históricos contra mulheres.

Preconceito é um substantivo que descreve a (falta de) qualidade e rigor intelectual ou moral de determinados conjuntos de crenças ou atitudes. A definição de dicionário não poderia ser menos clara:

1. Ideia ou conceito formado antecipadamente e sem fundamento sério ou imparcial.

2. Opinião desfavorável que não é baseada em dados objectivos. = INTOLERÂNCIA

3. Estado de abusão, de cegueira moral.

4. Superstição.

Assim sendo, preconceito contra mulheres pode ser definido claramente como uma idéia ou conceito sobre mulheres formado sem fundamento sério ou imparcial, possivelmente através de estado de abusão ou cegueira moral ou superstição, levando à uma opinião desfavorável que não é baseada em dados objetivos.

Misoginia (ódio ou desgosto de mulheres), sexismo, ou machismo são, assim, definidos.

Priberam: “Ideologia segundo a qual o homem domina socialmente a mulher.”

Michaelis: “Atitude ou comportamento de quem não admite a igualdade de direitos para o homem e a mulher…”

Porto: “ideologia que defende a supremacia do macho; atitude de dominação do homem em relação à mulher baseada na não aceitação da igualdade de direitos.”

Sociólogo Allan Johnson:

A [misoginia] é um aspecto central do preconceito sexista e ideológico, e, como tal, é uma base importante para a opressão de mulheres em sociedades dominadas pelo homem.

Relatório da OCDE sobre Sexismo Profissional:

Em muitos países, discriminação no mercado de trabalho é um fator crucial para disparidades de empregabilidade… influenciadas por valores culturais e sociais aprendidos de que se pode discriminar contra mulheres… por estereotipar determinadas tarefas ou estilos de vida como ‘masculinas’ ou ‘femininas’…

Relatório da ONU sobre Desafios de Mulheres Pelo Mundo:

…de modo geral, a inigualdade entre mulheres e homens em várias dimensões são determinadas pelas expectativas diferentes em papéis de gênero nas áreas produtivas e reprodutivas. Por exemplo… educação em alguns países involve menor investimento para meninas do que para meninos devido às baixas expectativas de retorno no investimento em mulheres. Ademais, o status subordinado de mulheres no lar é utilizado como argumento contra o investimento de tempo, além do aumento de incidência de violência contra a mulher. Mulheres trabalham mais horas que homens, com menos oportunidades no mercado de trabalho formal, porque as tarefas domésticas não são distribuídas igualmente dentro do lar…

O grande mal, como se pode imaginar, ocorre quando a consciência coletiva é fundamentada num conjunto de crenças baseadas em preconceitos nocivos a determinados grupos minoritários dentro do coletivo. No caso em questão, este grupo minoritário compõe metade do coletivo que, por motivos históricos de opressão e subjugação, permanece minoritário em acesso a poder e influência.

Ninguém disputa que as sociedades autóctones onde se insere o Mormonismo também não abraça preconceitos sexistas. Como vimos acima, o machismo é um problema endêmico na maioria das sociedades atuais. Contudo, isso tampouco desculpa o fato — e a relevância e a malignidade — do machismo prevalente dentro do Mormonismo.

Machismo Mórmon?

As reações mencionadas acima, que serão exploradas brevemente abaixo, expõe com clareza e sem ambiguidade o quão enraízado o preconceito machista está no consciente coletivo Mórmon.

A começar com a reação oficial da Igreja.

Em publicação oficial, a Igreja solicitou às mulheres do movimento ‘Ordene às Mulheres’ que se abstenham de manifestar seus desejos publicamente para serem maís incluídas dentro da sociedade Mórmon. O que estas mulhers desejam nada mais é que igualdade entre homens e mulheres — em status social, em oportunidades de liderança e decisão executiva, e de poder — e a resposta oficial da Igreja a este anseio resume-se assim em assegura-las que concessões recentes oferecidas pela liderança masculina deveriam satisfaze-las e que então deveriam por-se em seus devidos lugares:

Algumas conversas maravilhosas vem sido, e estão sendo, tidas concernente mulheres na Igreja e contribuições incalculáveis são feitas. As recentes mudanças que vocês viram, mais notadamente ao abaixarmos a idade mínima para missionárias, servem de exemplos e foram facilitadas pela sugestão de muitas mulheres SUD extraordinárias de todo o mundo.

Mulheres na Igreja, por uma larga maioria, não compartilham da sua advocacia pela ordenação ao Sacerdócio para mulheres e consideram esta posição extrema demais.

A Sessão do Sacerdócio da Conferência Geral é desenhada para fortalecer os homens e os meninos… Convidamo-nas, como nossas irmãs, a participar com mulheres de todo lugar na reunião paralela para mulheres e meninas… A reunião para mulheres é uma congregação notória de irmandade mundial… para focar na enaltação e doutrinas eternas relacionadas às mulheres.

O que esta representante oficial da Igreja está dizendo é que mulheres devem manter-se satisfeitas com o que recebem dos homens que lideram suas vidas espirituais e religiosas. Não é o lugar delas pensarem por si mesmas quais são as suas necessidades emocionais e espirituais, pois há homens encarregados que pensarão por elas. Ademais, além de não ponderem pensar ou decidir por si mesmas, elas devem agradecer pelo que já lhes foi feito ao invés de expressar o que elas realmente desejariam que se fizessem. O subtexto implícito aqui é que mulheres são incapazes de decidirem ou pensarem ou ponderarem (ou receberem revelações de Deus, que, supostamente, só aceitaria conversar com homens) por si mesmas, para si mesmas. Homens existem para fazer isso por elas.

Ignoremos, por um instante, a mentira de que a idade mínima para mulheres missionárias foi reduzida por causa de sugestões de mulheres mundo afora (assista aqui o Apóstolo Russell Nelson e Jeffrey Holland desmentindo essa afirmação), o fato permanece que, ainda que as idades mínimas tenham sido reduzidas, há uma diferenciação desnecessária e  ilógica entre homens e mulheres, aqueles podendo servir desde os 18 anos (e por 2 anos) enquanto estas apenas após os 19 anos (e por apenas 18 meses). Tal diferenciação, inteiramente sem qualquer motivo racional, apenas serve para manter o status inferior de mulheres frente aos homens.

Ninguém, óbviamente, gosta de ser classificado como preconceituoso. Pessoas sempre pensam bem de si mesmas por natureza. Isso é um viés cognitivo conhecido entres cientistas como o Efeito Dunning-Kruger (ou “superioridade ilusória”). Quando confrontadas com fatos que demonstram que desconfirmem suas crenças (e.g., que elas não sejam tão boas como imaginam ser) elas sofrem emocionalmente. Isso é uma reação cognitiva conhecida entre cientistas como Dissonância Cognitiva. Para reduzir a dissonância e ao mesmo tempo manter a superioridade ilusória, as pessoas costumeiramente se apegam aos seus preconceitos com mais afinco e alteram as aparências e consequências mais óbvias e externas. Neste caso, se vamos reduzir a idade mínima dos missionários, para não parecermos sexistas, vamos reduzir a idade mínima das missionárias também — mas não de maneira igual, pois afinal não são iguais! O sexismo não desaparece, apenas a aparência do sexismo.

O mesmo acontece com as sessões de Conferência Geral. Há uma sessão especificamente desenhada para homens (e meninos). Não podemos deixar entrar mulheres  no “clube especial para homens” pois ele deixaria de ser especial. Criamos, então, uma reunião para as mulheres e para lá devem ir. Não nos preocuparemos com o que elas querem, pois enquanto homens, sabemos o que é melhor para elas. Por havermos criado uma sessão só para elas, longe de nós homens, mostramos que não somos sexistas — há reuniões “exclusivas” para ambos os gêneros!

Mas o mais chama a atenção neste comunicado oficial é o roubo da voz. Mulheres não tem direito a sua própria voz. Elas não podem pedir o Sacerdócio. Serão expulsas do “espaço sagrado” em tôrno da Conferência. Elas não podem sequer determinar sua voz, pois lhes é dito o que “a maioria” das mulheres não quer o Sacerdócio. Mesmo que isso fosse verdade (ver abaixo), compete aos homens — e não às mulheres — estabelecer o que a maioria delas quer ou não quer.

E o golpe final é colocar toda essa argumentação machista na voz de uma mulher. Com dezenas de funcionários, o departamento de relações públicas coloca uma mulher para anunciar o repúdio da Igreja a este singelo movimento de mulheres SUD. Inseridas num contexto patriarcal por gerações — e por todas as suas vidas pessoais — mulheres passam a, passivamente, aceitar o modelo misoginista através de um processo psicológico denominado de sexismo internalizado.

Nenhum preconceito institucional seria relevante, contudo, se ele não distilasse pela população propriamente dita. No nosso caso específico, o seximos institucional SUD seria irrelevante se isso não se traduzisse em sexismo entre os membros da Igreja SUD. Certamente, não se pode dizer que todos os SUD, mas é preciso averiguar se não pode dizer que uma maioria significativa o seja.

A título de exemplos, seguem agora exemplos de reações de membros da Igreja aos artigos publicados aqui sobre o tema de mulheres Mórmons. Eles representam, de grosso modo, a maioria das reações (mas não todas — tivemos também muitas respostas positivas) e servem de exemplos claros de um machismo (às vezes) velado e insipiente. Como todo preconceito, suas argumentações são fundamentadas em profunda ignorância e medo. Como todo preconceito, eles se estruturam em uma ilusão de superioridade para defender-se de uma visível dissonância cognitiva.

Os comentários não estão incluídos aqui para escárnio, mas para educação e reflexão. O importante é enxergar os problemas aqui discutidos por detrás das palavras…

…não acho que nós mulheres precisamos ser ordenadas ao sacerdócio, sinceramente, acho que já o temos sem precisarmos sermos ordenadas (temos uma ligação imensa com o pai celestial e poderes grandiosos)

Ninguém duvida que esta mulher seja especial ou que não tenha “ligação imensa com o pai celestial e poderes grandiosos”. Mas ela não consegue perceber que sem “ser ordenada ao sacerdócio”, seus dons são secundários aos dons de qualquer homem que possa ser assim ordenado.

Ademais, a estruturação da sociedade Mórmon ao redor do Sacerdócio significa que o seu status enquanto mulher é secundário ao dos homens que a lideram, seus “poderes” e sua “ligação” não obstante.

Nao precisamos de maneira alguma receber o sacerdócio.Cada um tem seu papel a cumprir!

Não existe motivo racional e lógico que dite que mulheres não possam cumprir os mesmos papéis que homens. Mulheres são pessoas tanto quanto os homens, e como pessoas, cada uma tem talentos e dons específicos. Mulheres não tem um conjunto de talentos específicos que homens não possuem e vice-versa.

nunca tiveram nem terão [o Sacerdócio]!

Este comentário é simplesmente expõe profunda ignorância de história Mórmon e história Cristã.

Na minha opinião eu também acho desnecessário sacerdócio às mulheres, por uma razão simples, elas estão num estado espiritual bem mais elevado que nós homens, e digo isso também do fundo de minha alma…

Alguns homens acham que estão elogiando as mulheres com esse argumento, mas trata-se apenas de um sexismo velado. Homens e mulheres são pessoas, e como pessoas, apresentam dons individuais e idiosincráticos a cada pessoa. Promover a ideia de que determinado grupo (e.g., mulheres, Negros, Asiáticos, cegos, etc.) apresenta características distintas e separadas do resto da espécie de Seres Humanos é preconceituoso (e desprovado por centenas de estudos científicos).

Há mulheres espirituais e há mulheres não espirituais, assim como há homens espirituais e homens não espirituais.

Sempre vejo os temas abordados pela página e sempre tem alguma história de que alguém pediu alguma coisa a algum líder e o mesmo não concordou com ideia e pronto, vira polêmica.. Essa de mulheres serem ordenadas ao sacerdócio, foi demais!!! Somos nós que temos que nos adaptar a igreja, e não a igreja a nós!!!

A mensagem para as mulheres é: Não reclamem e aceitem seu status de segunda classe caladas. Os homens controlam a Igreja, e por tabela, as suas vidas? Então é assim que tem que ser.

Querer igualar o que eh diferente, eh complicado… Mas, assim como a jovem do texto, elas tem o arbítrio, segue se quiser. Lembrando sempre que elas precisam convocar com urgência a mãe celeste, poxa, coitadinha, passou o tempo todo sendo oprimida, nunca apareceu, nunca revelou nada, apenas o machista do seu esposo, vdg ele que manda, ele que aparece, manda apenas filhos cuidarem do seu povo, a autoridade para os filhos, anjos masculinos, ela nao reclamou por ter mandado um filho pra ser o salvador e nao uma filha, etc. etc. E tem que ser rápido, quanto tempo ela não já perdeu? Vi, estamos no últimos dias, se não correr o mundo acaba… Aff

O comentarista é intelectualmente incapaz de perceber o motivo porque homens recebem revelações sobre um Deus homem que ordena subjulgar mulheres e não recebem revelações sobre uma Deusa mulher!

Além da estupidez do comentário, nota-se uma profunda ignorância histórica sobre a questão de orar à Mãe Celestial. Apenas nas duas últimas décadas, Gordon Hinckley et al. orquestrou a excomunhão de várias mulheres que justamente defendiam pensar sobre — e orar para — a Mãe Celestial. Lynne Kanavel Whitesides, Maxine Hanks, Lavina Fielding Anderson, Janice M. Allred, e Margaret Toscano foram disciplinadas (i.e., excomungadas da Igreja) por escrever artigos e palestras e livros sobre, entre outras coisas, a Mãe Celestial.

O tom sarcástico e debochado, em conjunto com o preconceito latente e a ignorância dos fatos, apenas serve para demonstrar o desprezo inconsciente pelas preocupações e interesses das mulheres que saltam por detrás das palavras escolhidas para esconde-lo.

Sobre o Sacerdócio, as perguntas inicias deveriam começar com: Por que eu oro ao Pai Celeste e não a Mãe Celeste? Por que se apresentou dois homens para ser o Salvador e não foram mulheres? Por que foi escolhido um homem e não uma mulher? Por que Adão foi o primeiro e não Eva? E por aí vai, até chegar na pergunta do motivo dos meninos distribuírem o sacramento.

Novamente, a incapacidade intelectual de compreender as forças sociais e culturais que estabeleceram a estrutura patriarcal em conjunto com a mitologia fundacional de Criação. Adão veio primeiro porque homens escreveram o texto, e não mulheres. Isso é óbvio para qualquer pessoa inteligente que pára para pensar racionalmente no contexto histórico e cultural dos textos religiosos. Contudo, preconceito não é racional.

Não existe ordenação de mulheres ao sacerdócio no VT, não existe no Livro de Mormon, não existe em D&C, não existe em Pérola de Grande Valor, será se esqueci do NT? Não, não existe no NT, a não ser se pretendemos forçar poucos textos, a maior prova foi a o próprio Mestre, que chamou 12 HOMENS pra guiar sua igreja e portar as chaves, acho que não existe dúvidas

Novamente, o mesmo processo de cretinismo intelectual, reduzindo forças sociais e culturais complexas e milenares em modelos banais e simplistas, apenas para justificar o preconceito e reduzir a dissonância. Ignorando, ainda, que alguns Cristãos abraçavam a ordenaçam de mulheres no Cristianismo Primitivo (ver em “antecedentes”).

Sem esquecer de um grande detalhe, as mulheres que reivindicam o sacerdócio, precisam convocar com urgência a mãe celeste, poxa, coitadinha, passou o tempo todo sendo oprimida, nunca apareceu, nunca revelou nada, apenas o machista do seu esposo, ele que manda, ele que aparece, manda apenas filhos cuidarem do seu povo, a autoridade para os filhos, anjos masculinos, ela nao reclamou por ter mandado um filho pra ser o salvador e nao uma filha, etc. etc. E tem que ser rápido, quanto tempo ela não já perdeu? Vi, estamos no últimos dias, se não correr o mundo acaba… Aff

Os mesmos processos de redução de dissonância através de ignorância e submissão forçada, com tons de deboche e humilhação. Mostre este texto para qualquer psicólogo e as chances são grandes deste detectar mecanismos verbais de abuso emocional e psicológico nele. Infelizmente, muitos homens Mórmons são treinados desde a infância a interagirem assim com mulheres. A divisão entre meninos de 12 anos que são importantes e recebem o Sacerdócio e meninas de 12 anos que são mocinhas que vão aprender a costurar, cozinhar, e limpar deixa tais legados até a fase adulta.

Não é questão de falta de evidências, é questão são as provas contrárias. Vc está querendo dizer que poderia ter vindo uma salvadora ao invés do Salvador? Que no conselho era pra haverem mulheres se apresentando? E Eva poderia ser a primeira ao invés de Adão? E Jesus, poderia ter chamado 12 mulheres? OU se não pode, desde a existência pre mortal, qual base pra hoje mudar isso? Ou seja, desde a vida pré mortal eram homens, passou todo o tempo homens, e no fim dos tempos mulheres? A incoerência é explicita. A não ser que a mãe celeste comece a se manifestar.

Para este homem, é completamente inconcebível que uma mulher fosse importante o suficiente para ser uma “Salvardora”. Ou uma “Apóstola” (apesar de haver uma no Novo Testamento, que ele obviamente irá ignorar ou fingir que não está escrito o que está escrito).

As mulheres que fazem missão no templo tem autorização para exercer o sacerdócio, mas não o tem, não são portadoras. Isso é necessário para as ordenanças de investidura. Mas não concordo com a ideia de as mulheres receberem o sacerdócio, já temos responsabilidades demais como mães e esposa. Se um dia isso acontecer, torço muito para que os homens menstruem e fiquem grávidos!!

Reduzir as diferenças entre mulheres e homens aos genitais é, talvez, a forma mais crassa de sexismo que há. A mulher não é definida por sua vagina, ou seu útero, ou sua menstruação, ou sua capacidade de engravidar. Uma mulher que nasce com a Síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser não tem útero, não menstrua, e nunca engravidará, mas ela não é menos mulher que qualquer outra. E uma mulher que menstrua e engravida não é uma pessoa diferente de um homem que não menstrua e não engravida.

As responsabilidades de mãe e esposa devem ser as mesmas que as responsabilidades de pai e marido. Ambos devem dividir suas responsabilidades domésticas igualmente, e ambos podem servir sua comunidade religiosa igualmente.

…é uma regra o portador do sacerdócio ter que segurar a criança pra dar uma benção?

Procurar esconder o sexismo atrás de regras não o torna inexistente. Se é ou não é uma regra, é irrelevante. Esta é uma pergunta que não deveria sequer ser feita. Uma mulher deveria poder segurar seu bebê ao ser abençoado — ou abençoa-lo ela mesmo.

Em todas as alas que eu passei o terceiro discursante sempre foi um homem e na presidencia da dominical tb sempre vi homens sendo chamados. No meu ramo, nessas duas situações são mulheres.

Costumes, assim como regras, tampouco servem de justificativas racionais para práticas preconceituosas.

O terceiro orador e o presidente da escola dominical podem ser mulheres.

Podem ser mulheres? A forma não misoginista desta formulação seria: “Mulheres podem ser o que elas quiserem ser. Elas podem ser oradoras, presidentes, profetas, matriarcas, apóstolas, etc.”

Mas presidente da Escola Dominical ser mulher???
Alguém pode esclarecer como pode ser uma mulher presidente da escola dominical?

Simples. Elimando o preconceito contra mulheres de servirem em quaisquer capacidades para as quais seus talentos e dons individuais as qualificam enquanto seres humanos.

Em minha estaca anterior as mulheres podiam ser ultimas oradoras, já na minha estaca atual não. Nosso presidente de estaca recebeu instrução do setenta na conferência da estaca, não como regra, mas apenas para, em suas palavras, “seguir o exemplo da primeira presidência”. Por isso a presidência da estaca pediu aos bispados colocarem portadores do sacerdócio como últimos oradores.

E aí está, o principal motivo porque mulheres devem receber o Sacerdócio e servirem em posições de liderança, e como Apóstolas e Profetisas! “[S]eguir o exemplo da [P]rimeira [P]residência” é o maior e mais forte argumento para manter-se o status quo patriarcal e misoginista, e será o maior e mais forte argumento contra o preconceito e a misonigia quando o status quo mudar!

textos com forte teor feminista, assim como o machismo não deve ser aceito em qualquer grupo inclusive o religioso o feminismo e tão pernicioso e capaz de destruir valores quanto o machismo,tem tarefas que sinto dó de ver uma mulher realizar, mas sei que a mesma realiza por falta de oportunidade ou necessidade já fui missionário e sei a dificuldade que o missionário passa no campo, ontem mesmo vi o testemunho de uma síster que falava dos sofrimentos no campo, espirituais e físicos e relembrei como isso se passava comigo que não nasci na igreja e depois de um ano de membro fui para o campo sem saber o que me esperava, e fico pensando como é para as sísteres passar pela dureza do campo sendo elas mas refinadas e sensíveis sei que essas mulheres são super valorosas pois alem de estarem preparando-se para o casamento antes disso saem para dividir aquilo que lhe faz feliz, melhor que palavras ao vento de quem não pode lhe passar uma experiencia como a autora do texto e sentar-se por meia hora e usufruir da companhia de quem já pode viver esses ensinamentos e hoje poder pela experiencia tratar do assunto com verdadeira propriedade.

Feminismo é, por definição de dicionário, o “[m]ovimento ideológico que preconiza a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher ou a igualdade dos direitos dela aos do homem”. A ninguém, exceto ao machista, ofende a noção de mulheres serem tratadas igualmente a homens.

O argumento machista de “proteger” as mulheres por serem “refinadas e sensíveis” nada mais é que uma manifestação velada da ilusão de superioridade — eu sou machista, mas machismo é imoral, e eu me acho uma pessoa moral, então o meu machismo é “do tipo benigno”; eu “protejo”, não discrimino!

Nota-se o machismo inerente no comentário quando o autor procede a ofender uma mulher por ser jovem e solteira, como se essas condições lhe impossibilitassem de compreender sua condição de mulher. Ademais, sugere o autor que a única função de vida significante para uma mulher é ser “casada” com um homem e, portanto, a jovem e solteira deveria se “prepara[r] para o casamento” com um homem para que se complete como ser humano, ao invés de ponderar na sua vida e na sua condição feminina.

Conclusão

É importante salientar que Mórmons não acreditam que estão sendo sexistas enquanto tratam suas mulheres como correligionárias secundárias. Na maioria dos casos, e provavelmente na maioria dos líderes, Mórmons acreditam que estão sendo perfeitamente justos e caridosos com suas mulheres.

Não obstante, o preconceito é real e inegável. Assim  como é real o sofrimento e constrangimento causado por ele. Muda-lo não será tarefa fácil, ou simples, ou rápida. O primeiro passo seria reduzir a dissonância cognitiva aceitando e admitindo sua existência. O segundo passo seria reduzir a superioridade ilusória pedindo desculpas e planejando rectificação. O terceiro passo seria alterar o consciente coletivo incluindo mulheres em status de igualdade (e.g., ordenando-as ao Sacerdócio, chamando-as a posições de liderança como Bispas, Setentas, Apóstolas, etc.). Apenas após estas 3 fases poderíamos começar a curar-nos deste mal e evoluir para um Mormonismo inclusivo, sem sexismo ou misoginia.

Não são esses, afinal, os famosos “passos” para arrependimento que aprendemos nas escolas dominicais? Não precisamos, então, nos arrependermos de nossos pecados coletivos e geracionais contra nossas mulheres?

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Se você começa uma frase com "não sou machista, mas..." você pode ter certeza de que está sendo machista.

Se você começa uma frase com “não sou machista, mas…” você pode ter certeza de que está sendo machista.


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